O cientista britânico James Lovelock, conhecido por seus alertas precoces sobre a crise climática e por sua "hipótese Gaia", que considera a Terra como um ser vivo capaz de autorregulação, morreu aos 103 anos. A família informou nesta quarta-feira (27) o falecimento ocorrido na véspera.
"James Lovelock faleceu ontem (26) em casa, cercado por sua família, em seu 103º aniversário", disseram os parentes do cientista em comunicado.
"Para o mundo, era conhecido como um pioneiro, um profeta do clima e o inventor da teoria de Gaia", disse sua família, elogiando "um marido amável, uma pai fabuloso com uma curiosidade infinita e um malicioso senso de humor".
A família informou, ainda, que sua saúde se deteriorou após uma queda recente. Lovelock, que se apresentou ao longo de sua carreira como um "cientista independente", criou polêmica com uma visão apocalíptica da crise climática.
— É tarde, tarde demais para salvar o planeta como o conhecemos — disse ele à AFP em 2009, alguns meses antes da conferência climática de Copenhague (COP15), que terminou em fracasso.
— Preparem-se para grandes perdas humanas — costumava dizer, posição então minoritária no mundo científico.
Lovelock, nascido em 26 de julho de 1919, cresceu no sul de Londres no período entre guerras e trabalhou para o Instituto Britânico de Pesquisa Médica por 20 anos.
No início dos anos 1960, ele foi contratado pela Agência Espacial dos Estados Unidos (Nasa) e se mudou para a Califórnia para trabalhar na possibilidade de vida em Marte.
Ele é conhecido por ter formulado a "hipótese de Gaia" em 1970, que apresenta a Terra como um ser vivo capaz de se autorregular, teoria que na época foi criticada por seus colegas.
"Que vida e que histórias! O gênio de Jim (seu apelido) fez dele o Forrest Gump da ciência, dando forma às primeiras ciências climáticas, à busca de vida em Marte, à descoberta do buraco na camada de ozônio, à concepção do mundo como um sistema autorregulado", homenageou no Twitter seu biógrafo, o jornalista do Guardian Jonathan Watts.
"Trabalhando para Shell, NASA, MI6 (inteligência externa britânica) e Hewlett Packard, ele tinha acesso e conhecimento. Quando alertou o mundo sobre a crise climática, falou com imensa autoridade", disse Watts, enfatizando a tensa relação que manteve com os movimentos ambientalistas.
Ele "trabalhou para grupos petrolíferos, conglomerados químicos e para o exército. Era apaixonadamente pró-nuclear", acrescentou o biógrafo.
Seu apoio à energia nuclear e suas críticas às energias renováveis - declarou em 2009 que elas "não tinham o menor impacto na luta contra o aquecimento global" - chocaram os ambientalistas.
"Indiscutivelmente, o cientista independente mais importante do século passado, Lovelock estava décadas à frente de seu tempo em seu pensamento sobre a Terra e o clima", elogiou o Museu de Ciências de Londres.
Em entrevista à AFP em junho de 2020, Lovelock relativizou a pandemia de coronavírus que "mata principalmente os da minha idade - os mais velhos - e já são muitos".
— A mudança climática é mais perigosa para a vida na Terra do que quase qualquer outra doença concebível — disse ele.
* AFP