O padre alemão Johann Baptist Reus (1868 – 1947) não só abrasileirou seu nome para João Batista Reus quando chegou ao Rio Grande do Sul, em 1900, mas também ganhou status de santo em cidades como Rio Grande, Porto Alegre e, principalmente, São Leopoldo. Seus feitos levam milhares de pessoas anualmente à cidade da Região Metropolitana. Na missa realizada neste sábado (23) no Santuário Sagrado Coração de Jesus, erguido ao lado do túmulo do padre alemão, o bispo Zeno Hastenteufel apresentou um documento que pode ser o que faltava para transformar o Padre Reus, de vez, em santo.
Na comunidade religiosa de São Leopoldo, o carimbo da Igreja Católica seria apenas a oficialização de algo já estabelecido na cidade: Padre Reus era um homem abençoado. Desde 1953, autoridades religiosas pleiteiam a beatificação do padre alemão – o maior passo nesse sentido, porém, só foi dado em 2013, quando a Congregação para as Causas dos Santos, órgão da Igreja que trata apenas de canonizações, validou o processo referente a Reus.
Maior passo até agora, já que Omar Slaviero, um funcionário do setor de manutenção do Trensurb de 57 anos, diz ter sido salvo da morte por um milagre de Padre Reus há dois anos. E tem um laudo médico para provar (confira abaixo).
Omar esteve na missa deste sábado. Entregou nas mãos do bispo Hastenteufel o documento assinado pelo médico neurocirurgião Eduardo Mello Rodrigues. Quando o bispo leu trechos do laudo e deu seu relato da história – tratando o fato como "o milagre que faltava para a beatificação do Padre Reus, que deve estar pulando de alegria no céu" – houve quem chorasse aos soluços na igreja.
No laudo, o médico avalia que a recuperação do paciente após um acidente vascular cerebral (AVC) e uma consequente hidrocefalia (quando há um aumento de líquido entre o crânio e o cérebro) foi "totalmente atípica e cientificamente inexplicável".
— Nunca tinha visto — diz o médico, por telefone.
— Foi uma recuperação fora dos padrões, algo que eu não consigo explicar. Desde o início me chamou a atenção o otimismo da esposa dele na recuperação, algo totalmente incompatível com a realidade do paciente. Acredito que a fé transforma, sim — rende-se o neurocirurgião, que diz ser cristão, mas não devoto de Padre Reus, como boa parte de seus conterrâneos.
"É Deus e Padre Reus"
O milagre teria ocorrido há mais de dois anos, mas só foi revelado agora. Inês, a esposa de Omar, diz que não se sentia à vontade para revelar a graça alcançada – só foi contar a história para o bispo em uma viagem à Fátima, em Portugal, organizada pela paróquia em setembro.
O fato aconteceu em 2015: Omar voltou para casa após um dia de trabalho e, durante o banho, começou a sentir fortes dores na cabeça. Morador de Sapucaia, fez exames no hospital da cidade e foi encaminhado no mesmo dia para São Leopoldo, onde fez uma tomografia. Constatado um AVC hemorrágico, foi imediatamente levado à sala de cirurgia do Hospital Unimed de Novo Hamburgo, onde foi atendido pelo neurocirurgião. A primeira cirurgia causou complicações, levou o paciente a um coma, e, durante a recuperação, Omar foi acometido por uma infecção hospitalar. Teria de fazer outra cirurgia, desta vez ainda mais arriscada.
— O doutor me chamou de lado e praticamente disse para eu me despedir do meu marido. Se a primeira cirurgia já era arriscada, a segunda era um atestado de morte. Mas eu estava muito confiante, não chorei nenhuma vez. Tenho o Padre Reus comigo desde sempre. É Deus e Padre Reus — conta Inês Slaviero, esposa de Omar há mais de 30 anos, que revela que fez o pedido definitivo ao possível futuro santo:
— Em determinado momento, quando ele ainda estava se recuperando da primeira cirurgia, eu não aguentava mais e falei assim "Padre Reus, eu quero uma resposta até amanhã, seja qual for". Peguei um santinho que entregam aqui na igreja e coloquei embaixo do travesseiro dele. No outro dia, ele acordou.
Omar lembra de muito pouco. Diz que sempre foi devoto do padre, mas só agora entende de fato o poder de sua fé. Diz que depois de seu "segundo nascimento", está com a memória ainda melhor, voltou a ter sonhos (e a lembrar deles) e, principalmente, se tornou um homem mais emotivo.
— Aqui em São Leopoldo, é difícil não ser devoto de Padre Reus. Mas o que aconteceu comigo foi incrível — fala, de maneira atônita.
Agora, o laudo médico deve ser remetido para Roma, para apreciação das autoridades do Vaticano. Caso percebam que a prova é conclusiva, representantes podem ser enviados à cidade gaúcha para investigar o episódio e, caso tudo aconteça de acordo com o que Omar, Inês, o bispo, o médico e a comunidade de São Leopoldo creem, a canonização de Padre Reus segue para o carimbo do papa Francisco.
O bispo Hastenteufel ainda mostra receio ao falar sobre o assunto – durante a missa, disse que não ia chamar Omar ao palco para evitar superexposição ("vocês vão ficar tirando foto!"). Em caso de sucesso no pleito em Roma, aí sim diz que irá apresentá-lo publicamente como "o homem do milagre".
— Conforme o próprio médico diz, é inexplicável. É uma cura incompreensível — resumiu, após a missa.