Todo ano, a lista de leituras obrigatórias da UFRGS passa por um ajuste em que são suprimidas quatro obras e agregadas outras quatro, em um movimento que deixa entrever algumas das preocupações da universidade enquanto instituição no ensino de Literatura. As quatro inclusões deste ano, por exemplo, trazem dois exemplares consagrados da mais recente prosa em língua portuguesa, A Máquina de Fazer Espanhóis, de Valter Hugo Mãe e Diário da Queda, de Michel Laub. Dois romances que, a seu modo, falam da confusão de identidade contemporânea, da história como uma cadeia de fardos distribuídos de geração a geração. No livro de Mãe, um português envelhecido recolhido a um asilo reflete sobre um Portugal mergulhado no turbilhão da globalização. Já Diário da Queda reflete sobre os ecos contemporâneos da tragédia de Auschwitz, na história de um narrador que é neto de um sobrevivente do horror nazista.
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Outro dos indicados, Quarto de Despejo, de Carolina Maria de Jesus, representa não uma atualização com as vozes mais bem-sucedidas da atual literatura em português, mas um resgate de um depoimento fundamental na história das letras nacionais. Com o subtítulo Diário de uma Favelada, o livro, escrito em 1960, apresenta o cotidiano de Carolina em uma comunidade pobre de São Paulo. Mineira de nascimento, Carolina se mudou já adulta para a capital paulista. O que ela tem a contar sobre a vida dos favelados, suas dificuldades e o horizonte estreito que uma tal condição material descortina para os pobres é considerado um marco por ser a voz de uma mulher negra sobre um tema a respeito do escreveram, no Brasil, muitos homens brancos mergulhados em teorias mas não naquela realidade.
A quarta obra é um disco, Elis & Tom, de 1974. Há tempos que a posição oficial da UFRGS nesse sentido é de que a canção brasileira é, sim, literatura – um entendimento até hoje meio controverso, mas se até o Nobel se rendeu a Dylan, não tenho muito como discutir. É um disco, ouça.