Quase um ano se passou do anúncio da compra de repelentes para mulheres grávidas beneficiadas pelo Bolsa Família e nenhum frasco do produto chegou aos postos de saúde do país. A ação, anunciada pelo Ministério da Saúde no final de janeiro do ano passado, busca intensificar o combate ao mosquito Aedes aegypti, que transmite dengue, febre chikungunya e vírus zika – este último responsável pelo aumento dos casos de microcefalia nos bebês.
O Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário (MDS), que fará a identificação das grávidas beneficiadas, ainda não tem levantamento do número de mulheres que receberão o produto gratuitamente no Rio Grande do Sul. Há um ano, quando o anúncio foi feito, o MDS informou que seriam 9,1 mil beneficiadas na época.
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A primeira promessa foi feita em 27 de janeiro de 2016 pelo então ministro da Saúde Marcelo Castro, ainda no governo Dilma Rousseff. Em outubro de 2016, o atual ministro da Saúde, Ricardo Barros, prometeu que os produtos seriam distribuídos em dezembro. Não foram. A licitação para compra do produto só começou no mês passado e ainda não foi finalizada. O Ministério da Saúde não dá previsão de quando os repelentes serão entregues.
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Só com ventilador
Grávida de 20 semanas, a dona de casa Pâmela Santos da Silva, 21 anos, do Bairro Aparício Borges, na Zona Leste da Capital, não desliga o pequeno ventilador de casa. Tenta escapar dos mosquitos que se multiplicam com o clima quente e o esgoto a céu aberto que existe perto de onde mora. Para ela, esta é a forma mais eficaz de afastar os insetos.
Por orientação médica, tem outro cuidado diário: não sai de casa antes das 10h nem depois das 19h, período de maior proliferação dos mosquitos. Na Unidade de Saúde São Miguel, que atende a região onde Pâmela mora, nunca chegaram os repelentes:
– Realmente, tenho medo e tento fazer a minha parte para o bebê nascer com saúde.
À espera do segundo filho, Pâmela comprou um repelente no supermercado por R$ 30. A recomendação do fabricante é de aplicação a cada duas horas, mas Pâmela garante que não foi o suficiente pra afastar os mosquitos.
– Que bom seria se não precisássemos comprar. Se eu marcar bobeira, os mosquitos estão na minha volta – queixa-se.
Com a falta de previsão do Ministério da Saúde para que os repelentes sejam entregues nos postos, é possível que a filha de Pâmela, que se chamará Emanuelle e deve nascer em maio, chegue antes do produto.
O governo prevê a compra de 3 bilhões de horas de repelência (unidade de referência para a compra do produto), quantidade suficiente para proteger durante os nove meses de gravidez as 484 mil gestantes do Bolsa Família. Os produtos devem ter, no mínimo, quatro horas seguidas de proteção, conforme registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O valor estimado para a compra é de R$ 208 milhões.
Burocracia impede finalização da compra
Além de ter ser sido iniciada apenas em dezembro de 2016, a licitação de compra dos repelentes também enfrenta problemas burocráticos que impedem a sua finalização. Por meio de nota, o Ministério da Saúde informou que a licitação ocorreu em 6 de dezembro, com a participação de 23 empresas. Os cinco menores lances ficaram, pelo menos, 56% abaixo do valor de referência.
Duas das empresas que estavam concorrendo acionaram o Tribunal de Contas da União (TCU) para questionar critérios da concorrência e o produto oferecido por uma das empresas concorrentes. O TCU está analisando os dois questionamentos e, por enquanto, não emitiu qualquer decisão sobre o caso.
O TCU esclarece, no entanto, que a “análise no órgão não prejudica o andamento da licitação”.
O Ministério da Saúde afirma que a licitação já tem uma empresa vencedora, mas que está em fase de recurso das outras empresas concorrentes.