Diante da mobilização de usuários contra a adoção de franquia para uso da internet banda larga fixa, o Ministério das Comunicações decidiu ficar do lado do consumidor, ao menos por enquanto. O titular da pasta, André Figueiredo, vem sofrendo muita pressão. Há duas semanas, o presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), João Rezende, afirmou que "a era da internet ilimitada acabou", no mesmo dia em que o órgão regulador emitia medida cautelar proibindo por 90 dias a suspensão da internet para usuários que consumissem além da franquia mensal de dados contratada.
Usuários reagiram e a Ordem dos Advogados do Brasil ameaçou entrar na Justiça para defender o cumprimento do Marco Civil da Internet. O ministro André Figueiredo postou até vídeo no YouTube para defender a internet ilimitada. Em entrevista exclusiva ao Diário Catarinense, após participar de evento da Algar Telecom na quinta-feira, em Balneário Camboriú, Figueiredo reconheceu a troca de declarações inoportunas da Anatel e das operadoras e disse que o Brasil pode ter banda larga sem limite.
Ele também defendeu o programa Brasil Inteligente, que será lançado quinta-feira, cuja meta é levar até 2018 fibra ótica para 70% dos municípios que abrigam 95% da população brasileira. O governo federal ainda cogita editar um decreto presidencial proibindo o sistema de franquias da banda larga fixa. Veja a entrevista com o ministro:
Foi cancelada qualquer decisão sobre o limite do uso da internet fixa no país?
Foi suspensa por prazo indeterminado. Foi uma solicitação nossa, a presidente Dilma Rousseff tomou providências para evitar qualquer tipo de mudança nas franquias e nos planos de internet fixa. A ideia é que se construa, a partir deste tempo de suspensão, junto à sociedade civil um modelo que venha atender as necessidades do usuário. Desde o primeiro momento que um diretor de uma das operadoras [a Vivo] fez uma declaração inoportuna e infeliz e depois o presidente da Anatel [João Rezende] também não foi muito feliz na declaração dele, gerou toda essa celeuma justificada e nós tomamos desde sempre a posição de dizer: qualquer limitação à franquia, qualquer cerceamento à utilização de internet por parte do usuário brasileiro, o Ministério das Comunicações vai agir com muito rigor para evitar que decisões sejam tomadas nesse sentido. Conversamos com as operadoras uma a uma e tivemos respostas positivas de que elas estão abertas ao diálogo e queremos firmar compromisso público com a população de que não trariam, com suas medidas, nada que trouxesse prejuízo e elencamos tópicos: de forma alguma desrespeitar contratos vigentes; a coexistência de franquias limitadas em planos de franquias limitadas para aquele usuário que não demanda muita coisa na internet a não ser e-mail e redes sociais, que é um consumo muito pequeno e que ele não precisaria pagar mais por isso; também a existência de franquias ilimitadas; e, ao obter novos planos com franquias ilimitadas, esses planos não podem ter preços abusivos. Esses princípios estão norteando nosso diálogo com as operadoras, como a Anatel ao emitir essa cautelar suspendendo por prazo indeterminado. E em curto prazo não haverá mudanças para prejudicar o usuário.
Como foi esse apelo?
Chegaram individualmente, de entidades, e o que nós temos é a compreensão de que é indispensável o diálogo e o que notamos claramente é que, a despeito do interesse comercial que move as operadoras, elas também respeitam o que nós defendemos, que é o direito social. Por mais que o serviço de banda larga nova não esteja sujeito a uma intervenção maior do Estado, ele tem um nível de regulação por conta desse interesse social.
O senhor ficou surpreso com essa mobilização popular?
Não, na verdade, eu fiquei mais surpreso com uma declaração infeliz do diretor da operadora [Vivo] por conta de que nós já estávamos dialogando e eles já sabiam que não aceitaríamos isso. Mas o que move literalmente as nossas ações é que não vai haver extinção de franquias ilimitadas. Vários países têm planos de franquias ilimitadas e o Brasil especificamente, até por conta do nosso programa de universalização da banda larga que estamos lançando, o Brasil Inteligente, que prevê todos os mecanismos de facilitação para que a população brasileira tenha acesso à internet. O programa vai desde levar fibra óptica aos municípios brasileiros a lançar um satélite no final do ano para que o sinal chegue a pontos mais remotos, como Fernando de Noronha, Nordeste, Norte e distritos que realmente ficariam caros para serem atendidos com fibras e chegaremos com satélites.
Tem algum modelo do exterior que é mais adequado para o Brasil?
Nós estamos construindo alguns modelos. Temos na Europa vários exemplos, mas queremos construir o modelo brasileiro. O Brasil é um país continental, com realidades distintas. Então nós temos locais onde a concorrência por si só se regula, por isso temos que ter um olhar atento. Temos que estar sempre olhando o Brasil com suas diferentes características para que de repente um usuário do Norte ou do Nordeste não venha pagar muito mais pelo mesmo pacote que usuários do Sudeste e do Sul. Nós queremos fazer com que o Brasil seja tratado de uma maneira uniforme. Sabemos que existem interesses comerciais, ninguém desrespeita, mas existe o interesse social que é muito forte.
Vai ser possível conciliar o interesse das empresas com os dos usuários oferecendo serviço de qualidade?
Sem dúvida. Isso é um dos pressupostos do nosso programa Brasil Inteligente. Não vamos aceitar, por conta desses interesses, o comprometimento do acesso e da velocidade da internet. Hoje em dia, temos a proliferação dos serviços over-the-top, Netflix, Google, que são serviços que consomem uma capacidade muito grande, só que o usuário normal não tem esse problema se tiver uma franquia ilimitada. Existem operadoras que têm pacotes, mas os pacotes são tão caros que se o usuário não for um heavy user, não vale a pena pagar.