Por mais de 50 anos, ela reinou absoluta, loira e magérrima nas brincadeiras das meninas que não cansavam de tirar e colocar suas roupas e sapatinhos. Até que a Barbie, ícone da perfeição, deixou de ser a mocinha e passou a ser alvo de críticas por representar um padrão de beleza inatingível. Depois de 57 anos, a fabricante Mattel reinventou a boneca para acompanhar as mudanças culturais e comportamentais e da sociedade e das mulheres contemporâneas.
De olho na diversidade, Barbie agora tem novos tipos de corpo, tons de pele e estilos de cabelo
Em busca da diversidade, a empresa anunciou ontem uma mudança impactante na sua produção: vai lançar, ao longo de 2016, novas bonecas com três formatos de corpos diferentes e que fogem do padrão cintura de pilão e pernas longilíneas. A primeira delas, chamada de Curvy, tem quadril mais largo e bumbum avantajado. Em reportagem publicada na revista norte-americana Time, a repórter Eliana Dockterman descreve a dificuldade em vestir uma roupa na boneca em função dos seus novos atributos mais volumosos. Também fazem parte da nova leva a Tall, mais alta, e a Petite, mais baixa. Fora isso, a empresa criou novos tons de pele e diversas combinações de cabelo.
Mãe de Mikaela, seis anos, a designer de moda Gabriela Lima, 29, aprovou a iniciativa:
Ativistas contestam falta de privacidade da nova Barbie
– Elas estão com corpos diferentes, né? Menos irreais. Eu adorei! Acho bem errado esse conceito que a Barbie passa de perfeição. De tão magra, ela nem é simétrica.
Gabriela garante que, apesar de a filha ser dona de algumas bonecas, nenhuma foi dada por ela. Mas, diante dos novos modelos, até pensaria no caso:
– Daria a curvilínea. Acho bom que ela veja a diversidade de corpos, e não só esse conceito padrão.
Decisão contemporânea com olho no mercado
Especialistas concordam que apresentar às crianças modelos diferentes é construtivo à medida que elas se aproximam da realidade e são semelhantes às pessoas que estão no seu círculo de convivência, como professoras, amiguinhas e até mesmo a mãe.
– Quanto mais diversidade tu tiveres no brinquedo, mais ele é compatível com o que a gente vive – observa a pediatra Clarissa Gralha, coordenadora do Centro de Estudos, Atendimento e Pesquisa da Infância e Adolescência, em Porto Alegre.
Cientista afirma que meninas deveriam brincar menos com bonecas
Para a assistente social e nutricionista Flávia Felippe, os novos modelos são importantes, mas não se pode fechar os olhos para o interesse comercial por trás da decisão:
– A gente pode pensar que a indústria de consumo vai sempre se adequando ao que vende, então, hoje, em uma postura mais politicamente correta existe uma preocupação com estigmas, estereótipos de corpo perfeito. É positivo, existem diferentes tipos de corpos. Que bom que as empresas estejam pensando em agradar a todos as pessoas e não fiquem estimulando essa busca insana pelo esteticamente inalcançável – avalia.
Comemorada por muitos, a decisão de criar os novos modelos também é vista como marketing pela psicanalista e coordenadora do Núcleo de Doenças da Beleza da PUCRJ, Joana Novaes. Segundo ela, fatores culturais, como o aumento do consumo de jogos eletrônicos, acarretaram em uma queda na comercialização. As novas Barbies seriam uma tentativa de impulsionar as vendas – que despencaram 20% entre 2012 e 2014.
Divertidas e baratas, brincadeiras caseiras aproximam pais e filhos
– Tem esse fator marqueteiro para alavancar novas vendas e, dentro dessa estratégia, a boneca precisa espelhar uma série de valores dos costumes contemporâneos. Eu diria que esse aspecto da diversidade é mais representado em termos étnicos, mas eu não vi a Barbie obesa ou a Barbie velha – destaca.
O lançamento não é a primeira tentativa da fabricante de se reaproximar com o mercado. Em 2015, a Mattel desenvolveu bonecas com novas etnias e até uma que não usava salto alto.