Quando Hamish Bowles era garotinho e ainda caminhava com a mãe pelas ruas perto de sua casa, no bairro de Hampstead Garden Suburb, em Londres, viu uma indiana elegante, usando um sari elaborado, caminhando em sua direção.
- Hamish correu para a mulher e começou a puxar a roupa - contou, recentemente, Anne Bowles, sua mãe.
- 'Mamãe, mamãe, olha, tem fio dourado' - ela relembra o que o menino disse.
- Ali já deu para ver que Hamish se interessava pela moda - concluiu.
Pois os fios coloridos não se mostraram um interesse passageiro para Bowles, o elegante editor internacional da Vogue escolhido para assumir o lugar (se não os caftãs folgados) de André Leon Talley, o colunista que deixou a revista em fevereiro para editar a Numero Russia.
- Queríamos preencher o vazio com outra voz convincente, persuasiva, que trouxesse ao público o mundo da moda, das viagens e dos lugares extraordinários a que Hamish vai e as pessoas que vê - explica Anna Wintour, editora da Vogue.
Para a festa que ela organizou em junho para o 50º aniversário de Bowles, Ralph Lauren fez um terno de três peças em rosa ao qual o homenageado prendeu uma corrente e um alfinete art déco com um diamante e uma esmeralda.
- Vida longa para a rainha de lilás e que encontre entre as pilhas de quinquilharias um casaco Balenciaga - o escritor Christopher Mason fez um brinde a Bowles (conhecido pela paixão pela cor) cantando.
E olha ele estava sendo sutil. Se Talley fosse o estagiário da Vogue, pavoneando-se de capa e dando ordens, Bowles seria seu professor, com uma das maiores coleções particulares de roupas vintage do mundo, que guarda no Bronx e no Queens. A convite de Oscar de la Renta, foi o curador da exposição "Balenciaga na Espanha" que passou por Nova Iorque e São Francisco há dois anos - assim como da mostra "Jacqueline Kennedy e os Anos na Casa Branca", no Museu Metropolitano de Arte, em 2001.
Sua nova coluna começou com uma visita a Chatsworth, onde moram o Duque e a Duquesa de Devonshire.
Entretanto, Bowles já mostrou também um lado cômico, apostando em um jornalismo "de imersão" e uma visita a Boulder Survival School, uma sessão de surf com Blake Lively e, segundo sugestão da própria Wintour, um teste para "The X Factor". (Ele é famoso por cantar as músicas de shows da Broadway no Marie's Crisis de Greenwich Village.)
- As sugestões das matérias experimentais que tenho feito vêm da Anna e dos outros editores - contou ele outro dia, sentado em seu duplex chique, decorado pelos amigos Roberto Peregalli e Laura Rimini, protegidos do mestre italiano Lorenzo Mongiardino.
- As ideias surgem em suas mentes ardilosas - completou, meio brincando, meio falando sério.
As paredes da sala estavam cobertas de estantes lotadas de livros e trabalhos cuidadosamente organizados em biografias, moda e decoração.
- Optamos por fazer algo Proustiano aqui, mas lá em cima, preferi um visual mais Madeleine Castaing - referindo-se à decoradora francesa famosa por misturar peças francesas, russas, britânicas e acessórios baratos.
É de se esperar que Bowles se sinta pouco à vontade em qualquer outro mundo que não seja o de grandeza aristocrática que ele ama analisar, mas Wintour garante que essa é uma noção equivocada.
- Temos essa ideia de que Hamish é uma pessoa especial que vive em um mundo especial, mas não é nada disso. Ele se sente em casa em qualquer lugar - disse.
Um editor de uma publicação rival que preferiu não se identificar sugeriu que o fato de Bowles cobrir essas matérias estranhas faz parte de uma estratégia consciente de Wintour para torná-lo mais acessível.
- Seu foco era muito limitado, muito exclusivo. Acho que a Anna quis ampliá-lo para que os leitores pudessem se identificar. Se você está nas redes sociais não pode ser uma pessoa que só fala de mercados de pulgas em Paris - disse.
Bowles concorda.
- A nova abordagem dá um sentido de variedade àquilo que era visto como uma 'realidade dourada e restrita' - disse.
Quando Hamish tinha seis anos, sua família percorreu o norte da África em um trailer Volkswagen.
- No Marrocos, ele começou a desenhar roupas femininas. Desenhava toda noite. Aos nove anos de idade costumava entrar nas lojas de roupas de instituições de caridade para ver os forros. Foi quando começou a colecionar. Visitávamos feiras de antiguidades. Várias mulheres faziam amizade com ele e lhe davam pequenas amostras de renda vitoriana - conta a mãe.
Bowles também fala de suas recordações:
- Comecei a prestar atenção nas revistas de moda, principalmente a Vogue britânica. Li muita coisa sobre Cecil Beaton e foi aí que achei que deveria começar a colecionar - relembra.
Aos 14, Hamish se inscreveu em um concurso promovido pela Vogue britânica, concorrendo com seus desenhos e um artigo sobre seu estilista favorito e ganhou menção honrosa.
- Aquele foi o momento decisivo. Foi convidado para trabalhar na Vogue, à base de champanhe e suco de laranja, e nunca mais olhou para trás - resume a mãe.
Se o interesse em moda e estilo extravagante fez de Bowles um desajustado durante a infância e adolescência, ele encontrou seu nicho quando foi aceito na Saint Martin's School of Art, onde estudou Jornalismo de Moda. Aos 19, foi contratado para trabalhar na edição adolescente da Harpers & Queen; três anos depois, depois de se destacar com um talento considerado muitas vezes excêntrico - como a foto que ficou conhecida como o "Assassinato no Expresso Americano" - tornou-se o editor de moda mais jovem da revista.
O garoto revelação chamou a atenção de Wintour. Em 1993, ano em que a Vogue norte-americana fotografou seu apartamento lilás em Londres, Bowles aceitou a oferta que lhe fizeram para trabalhar em Nova Iorque.
- Tinham surgido algumas coisas interessantes, mas não irresistíveis; aí, veio o convite - conta ele.
Sua ascensão não foi exatamente tranquila: escolhido para tocar a Vogue Living, em 2006, a revista acabou não dando certo, em parte por causa da crise econômica.
- Na verdade estávamos fazendo um teste, mas o período se mostrou turbulento demais - explica.
Apesar do tropeço, fez um batalhão de amigos entre celebridades e socialites - tanto que foi convidado por Sarah Jessica Parker para acompanhá-la à festa do Costume Institute em maio.
E sua agenda de viagem é formidável até para o grupinho seleto da moda internacional: no fim de junho, foi para Miami para o casamento do astro do Knicks, Amar'e Stoudemire, com quem já fez uma matéria, com Alexis Welch. De lá, foi para Paris para ver alguns desfiles e depois para Veneza, onde participou de um baile de máscaras para 400 pessoas organizado pela Dolce & Gabbana.
Na manhã seguinte foi ver a exposição de Manet no Palazzo Ducale, classificando-a como "impressionante" antes de pegar o voo de volta a Nova Iorque, onde aproveitou seu tempo livre para - em suas próprias palavras - "agonizar" sobre o trabalho filantrópico de Emma Bloomberg, filha mais velha do prefeito da cidade, Michael R. Bloomberg.
Segundo Wintour e alguns colegas, Bowles não é lá muito bom em cumprir prazos, mas a cobertura de suas aventuras pelo mundo conseguiu sair no número de setembro, incluindo uma observação feita por Caroline Sieber, estilista e embaixadora da grife Chanel (a cujo casamento ele também foi), de que tinha seguido o conselho de Bowles em relação ao vestido de noiva.
Contradizendo seu estilo discreto, Bowles escreveu sobre sua própria festa de aniversário. Durante o brinde, Wintour confessou ter se sentido honrada por ter sido convidada por Bowles a organizar um jantar para 20 pessoas (que acabaram virando cem), que foi seguido de mais dois jantares e uma "fête champêtre" na Inglaterra.
- Descobri que meu nome era o primeiro em uma lista de eventos que mais parecia uma turnê pelo mundo todo, mas, na verdade, o jantar foi só o aperitivo de uma série de comemorações - disse Wintour, com uma ponta de orgulho na voz.