Eu sou o Lorax. Eu falo em nome dos arbustos.
Essa fala não causa muito impacto, não é? O eco-guerreiro marrom e antiquado da obra do Dr. Seuss nunca fez estardalhaço sobre a santidade de uma cerca-viva. E nem eu.
Há poucas semanas, resolvi arrancar alguns arbustos e abrir espaço para uma horta de 13,9 m². Minha situação pode soar familiar para qualquer dono de terra que já tenha andado por sua propriedade e desejado que uma horta se materializasse como mágica. Esse lugar tem muita sombra, aquele já é usado como campo de críquete na festa anual do Dia da Bandeira.
Veja o jardim do meu condomínio (por favor!). Parece grande o suficiente para uma propriedade urbana: cerca de 0,2 hectares. Mas quando você se muda para uma casa que já serviu para outro fim, e cuja juventude já foi e voltou, você não começa do zero. Ao longo de décadas, diversos jardineiros entulharam a área comum com truques baratos. Então, foram atrás de campos mais verdes - ou acabaram ficando enterrados permanentemente.
Na verdade, ninguém (vivo) no condomínio reclamou posse da meia dúzia de rosas-rugosas largadas perto da garagem. Elas tinham 2,7 m de altura, tinham troncos ramificados e, a maioria, sem flores. Como planta ornamental, esses arbustos eram apenas folhagem.
Não senti remorso algum em arrancá-las da terra. Senti horror - mas esse é outro assunto.
Lembro da última vez em que tive problemas com uma planta perene e lenhosa: Syringa vulgaris, o comum (ou vulgar) lilás. Sim, os botões lavanda desse arbusto carregam a bela textura e o perfume da árvore de Trúfula de Seuss. Durante cerca de seis dias ao ano. Nas 51 semanas restantes, o lilás junta mofo sobre suas folhas sem-graça, assegurando 27,9 m² de solo.
Para combater o lilás, eu juntei um esquadrão de cinco campeões robustos, fortalecidos com pás e alicates. Como reforço, poderíamos convocar uma caminhonete com cabos presos ao engate.
Todas essas ferramentas funcionaram quase do mesmo jeito, ou seja, não funcionaram. Não havia "uma raiz" discreta para cortar e remover: o jardim inteiro era a raiz.
Dez anos depois, ao invés de repetir aquela loucura com as rosas que cresceram demais, eu busquei conselhos com um mestre dos arbustos no Jardim Botânico do Brooklyn: Chris Roddick, de 48 anos, paisagista e supervisor das plantações.
- É um trabalho pesado - disse ele - É por isso que as pessoas contratam jardineiros. Esse é o tipo de jardinagem que eles não mostram nos programas sobre o assunto.
A raiz do problema eram as raízes. Dependendo do solo - o mais fundo tem, provavelmente, 45 cm - disse Roddick - A maioria deles tem, provavelmente, menos de 30 cm. Conforme ficam mais fundos, há menos oxigênio no solo.
Mas as raízes se espalham horizontalmente, como um organograma anarquista. O que mantia o arbusto no lugar nada mais era além de fricção. E nada menos.
- Eis o que eu faria - disse Roddick - Eu os cortaria a cerca de 90 cm acima do solo. Noventa ou até mesmo 1,20 m, dependendo da grossura dos galhos. É daí que você vai tirar a alavanca. Você não deve cortá-los na base, ou não vai ter o que puxar. Muitas pessoas cometem esse erro.
Ele continuou - Então você pega ou uma pá ou uma picareta, e começa a abrir valas ao redor da planta - como se você fosse transplantá-la - a uns 60 ou 90 cm da planta.
Uma pessoa precisaria agarrar o tronco, ele disse, e "mexer para frente e para trás."
- É como tirar um dente - disse ele - Enquanto você está mexendo para frente e para trás você vai sentir as raízes ao lado da planta. E é ali que você vai cortar.
Alguns instrumentos cirúrgicos podem ser úteis para matar um paciente. Uma pá afiada poderia ser um bisturi bruto para amputar as raízes. As artérias mais grossas poderiam pedir por um alicate ou um antigo serrote.
Outra alternativa seria tentar desalojar a planta usando um pé de cabra. É uma barra de 2 m, estupidamente pesada, que também seria eficiente para lascar gelo ou machucar um urso. Mais tarde, eu pude içar o emaranhado de raízes esclerófilas acima da minha cabeça e dar meu grito primitivo.
- Você vai se sujar bastante - disse Roddick.
- Mas quando estiver acabado - completou - você terá um troféu, como chifres, que você pode pendurar acima da lareira. O que é mais ou menos o que aconteceu na tarde do domingo seguinte, quando cinco dos meus amigos e 12 dos meus jovens aprendizes se juntaram no jardim. Fizemos muita força para usar as pás e abusamos da picareta. (Eu não diria, necessariamente, que foi uma ideia brilhante dar um serrote a uma criança de 5 anos sem supervisão. Meu filho diria). E nós amontoamos a folhagem espinhosa em um tipo de cerca de arame farpado vegetal, que seria um ótimo recurso de design para uma prisão de segurança máxima sustentável.
A certa altura, meu amigo Joel Turnipseed (sim, este era seu verdadeiro nome) gritou - F x D é igual a T. Joel dirigia caminhões na marinha; ele escreveu um memorando idiossincrático da Guerra do Golfo Pérsico. E eu tive a sensação, parado ali no jardim, que a cultura da marinha pode ter sido difícil de se enquadrar. Então ele explicou - Força vezes a distância da força aplicada até o ponto fixo é igual ao torque!
Sim, é, mais ou menos. E então o arbusto saiu da sujeira - primeiro rapidamente, depois devagar. No final, eu me vi com uma pergunta: Se alguns poucos arbustos representaram tanto incômodo, como os primeiros fazendeiros americanos conseguiram limpar 300 anos de inúmeras árvores de madeira dura?
Curiosamente, Alan Taylor, professor de história na Universidade da Califórnia, em Davis, examinou esse mesmo assunto em uma monografia fascinante, de 1995, intitulada "The Great Change Begins: Settling the Forest of Central New York" (publicado no jornal New York History).
Começando pela era federalista, Taylor explica, que a população de Nova York quadruplicou em apenas três décadas, chegando aos 1.372.812 em 1820. Fazendeiros alemães e holandeses se mantiveram nas várzeas férteis do Hudson Valley, onde um topógrafo relatou - As áreas planas são mais fáceis de limpar; em muitos lugares, um homem pode limpar um acre (de terra) em um dia.
A mesma tarefa pode demorar duas semanas para os desbravadores "Yankee", que se mudaram da Nova Inglaterra para os planaltos arborizados ao norte e a oeste de Albany. O desmatamento ali foi metódico e esgotante, escreve Taylor - Havia cinco passos para o sistema Yankee: corte, exploração madeireira, secagem, queimada e coleta de cinzas. Os cortes começavam na primavera. Em seguida, os homens com machados deixavam os troncos com 4,3 m e os guardavam, usando juntas de bois. Depois de um verão quente, e frequentemente de um inverno, os Yankees colocavam fogo na pilha toda. Esse fogo era espetacular e terrível de se ver.
Os alqueires de cinzas remanescentes tinham um valor monetário no mercado industrial. (Meio hectare de cinzas podia pagar de US$ 3,25 a US$ 6,25, mais da metade do custo de contratar uma equipe para limpar outro meio hectare de madeira.). Potassa, o produto final, era exportado para os moinhos e fábricas de sabonete da Grã-Bretanha. E enquanto alguns fazendeiros reutilizavam suas cinzas como fertilizantes, a saúde da terra foi uma reflexão tardia. Ou, como Taylor coloca - Como uma zona de guerra ecológica, a fronteira agrícola não era uma visão bonita. Basil Hall, visitante na fronteira de Nova York, encontrou os colonos lutando para dominar uma intimidadora massa de madeira - Alguns dos campos foram semeados com trigo, sobre os quais era possível ver inúmeros tocos de árvores feios; outros podiam deitar na grama, guardados, como eram, por um conjunto de monstros pretos gigantes, os restos anelados, queimados e secos da antiga floresta.
O Lorax, provavelmente, não gostaria disso.