MONTREAL – É um ritual transmitido amplamente todos os anos durante as eliminatórias da Liga Nacional de Hóquei: poderosos jogadores de hóquei em seus ternos poderosos adentrando a arena.
E, por décadas, um pequeno alfaiate tem vestido um sem-número de grandes astros do hóquei. Giovanni Vacca, de 86 anos e 1,65 m de altura, veste terno preto, malha com gola V e camisa social. Dirige seu negócio no coração no bairro de Little Italy, em Montreal, onde costurou ternos para centenas de jogadores profissionais de hóquei e executivos – incluindo finalistas da Copa Stanley deste ano, como o gerente geral do Boston Bruins, Don Sweeney, e o capitão do St. Louis Blues, Alex Pietrangelo.
A lista de clientes de Vacca parece uma página tirada dos livros de grandes conquistas da Liga Nacional de Hóquei. Dos anos 90 ao início dos anos 2000: Wayne Gretzky, Rob Blake, Kevin Stevens, Theo Fleury, Brian Leetch e Mark Recchi. A lista ainda inclui Sidney Crosby, Shea Weber, Joe Thornton e Brent Burns.
Vacca chegou a Montreal vindo de San Pietro Infine, uma pequena cidade a aproximadamente 145 quilômetros de Roma, em 1948, aos 15 anos. Ele sempre teve um instinto para a costura e foi aprendiz em muitas lojas de Montreal antes de abrir a Giovanni Clothes, em 1965.
"Eu queria ir além, por isso decidi seguir meu próprio caminho. Os fornecedores colaboravam muito comigo e eu tinha um bom nome. As pessoas começaram a vir. Um contava para o outro", lembrou.
Apesar de ser conhecido por seus clientes do mundo do hóquei, foi uma equipe de beisebol, o Montreal Expos, que primeiro percorreu a Boulevard St. Laurent para ver Vacca. "Um dos primeiros a entrar foi Rusty Staub", disse, referindo-se a uma das primeiras estrelas do time.
"De repente, todo mundo ficou sabendo que os jogadores precisavam se vestir bem sem gastar muito. Eles passam tempo com você para que você fique feliz com o terno que está comprando", disse Warren Cromartie, defensor do Expos por nove temporadas.
O nome de Vacca se espalhou pela comunidade da Liga Principal de Beisebol e não demorou para que times visitantes fizessem uma parada em sua loja de três andares. Segundo Cromartie, Vacca foi responsável pelo primeiro terno do antigo rei dos home runs, Sammy Sosa.
"Andre Dawson sugeriu que ele fosse até Giovanni. Sammy comprou dois ternos, apesar de o Andre ter dito a ele que era para comprar só um!", contou Cromartie. Pode colocar na conta: um grande do New York Yankee como mais um cliente satisfeito. "Joe Torre entrava, ele era um homem bacana. Depois, jantávamos juntos", disse Vacca.
Vacca também vestiu muitos integrantes do campeão da Copa Stanley da Liga Nacional de Hóquei de 1994, os New York Rangers, incluindo Neil Smith, responsável por montar o time. "Ele se importa muito com os clientes e os ternos que cria são de excelente qualidade", elogiou Smith, antigo gerente geral dos Rangers.
À medida que os esportes profissionais deixaram a maneira mais familiar de operar dos anos 60 para se transformarem na indústria bilionária de hoje, Vacca mudou sua abordagem. Os jogadores não saem do hotel para visitar a loja em Little Italy. Agora, é o filho, Domenico, que cai na estrada para vestir times em casa.
"Por anos e anos os jogadores frequentaram nosso escritório. A partir da metade dos anos 80, começou a ser instituído o toque de recolher e eles não podiam mais ficar fora até tarde. Foi Kevin Stevens quem disse: 'Dom, por que você não se encontra com a gente pelo caminho?' Quando vi, já estava indo a todos os lugares", descreveu Domenico durante uma entrevista em Nashville, Tennessee, aonde tinha ido para tirar as medidas dos Predators naquele dia.
Foi a abordagem centrada no jogador que conquistou mais um cliente, Jonathan Drouin, lateral do Montreal Canadiens, que cresceu a 100 quilômetros da Giovanni Clothes. Os dois se conheceram há alguns anos, enquanto Domenico vestia o antigo time defendido por Drouin, o Tampa Bay Lightning. "Alguns dos caras me disseram que eu fosse vê-lo. Gosto dos ternos que ele faz, o caimento, as marcas. Sempre gosto de voltar para o Domenico", relatou Drouin.
Durante o curso de 50 anos, pai e filho viram estilos e tipos físicos evoluírem. A Liga, que antes valorizava grandes jogadores de ombros largos, passou a dar mais ênfase a tipos menores e mais rápidos. Os homens da família Vacca perceberam a evolução.
Hoje em dia, os jogadores realmente sabem o que querem. Vinte anos atrás, eles pediam minha opinião. Ninguém tinha uma visão clara. Eles ainda pedem minha opinião, mas sabem com mais clareza o que querem.
DOMENICO VACCA
alfaiate
"Hoje em dia, os jogadores querem um caimento mais esguio e justo. Em vez de grandes ternos, passamos a fazer menores", comparou Giovanni. "Hoje em dia, os jogadores realmente sabem o que querem. Vinte anos atrás, eles pediam minha opinião. Ninguém tinha uma visão clara. Eles ainda pedem minha opinião, mas sabem com mais clareza o que querem", disse Domenico.
Como a arte de fazer ternos, a arte de construir um relacionamento é delicada e levada a sério. Assim, após cinco décadas vestindo reis do home run e campeões de gols, sem mencionar a Real Polícia Montada do Canadá e executivos, qual é o segredo para manter esses relacionamentos?
"Um cara que entra e compra um terno é tratado da mesma maneira que aquele que compra dez. São todos iguais", revelou Giovanni.
"É uma história. O que posso lhe dizer?"
Por Salim Valji