O produtor americano de cinema Harvey Weinstein, acusado por 100 mulheres de assédio e abuso sexual, foi formalmente acusado em um tribunal de Nova York, nesta sexta-feira (25), por um estupro em 2013 e uma agressão sexual em 2004, uma primeira batalha vencida pelo movimento #MeToo.
Quase oito meses depois de sua carreira afundar e de não aparecer publicamente, Weinstein se entregou na delegacia de polícia de Manhattan na manhã desta sexta-feira, e uma hora e meia depois saiu algemado, com as mãos para trás, para ser escoltado até o tribunal distrital, localizado não longe dali.
Em um breve comparecimento, o juiz confirmou as condições de sua libertação sob fiança, negociadas de antemão com seu advogado, Ben Brafman: um depósito de um milhão de dólares em espécie, a obrigação de usar pulseira eletrônica e a entrega de seu passaporte às autoridades. Seus deslocamentos deverão se limitar aos estados de Nova York e Connecticut.
O produtor não deu nenhuma declaração, mas Brafman disse à imprensa que Weinstein, outrora uma das personalidades mais influentes de Hollywood e cujos filmes ganharam dezenas de Oscars, "se declarará inocente".
— Temos a intenção de agir rapidamente para que essas acusações sejam desconsideradas — acrescentou o famoso advogado em frente ao tribunal de Manhattan. — Acreditamos que não estão respaldadas com evidências.
A próxima audiência foi marcada para 30 de julho.
O escritório do promotor do distrito Cyrus Vance declarou que uma das acusações se relaciona com eventos que datam de 18 de março de 2013. A identidade da vítima não foi divulgada. Pode ser um incidente do qual ninguém falou publicamente até agora.
A segunda, de agressão sexual, que data do verão de 2004, parece corresponder à de Lucia Evans, que já havia denunciado que o ex-magnata a forçou a fazer sexo oral nele. O promotor não confirmou que tenha sido ela.
— As acusações de hoje refletem avanços significativos nessa investigação ativa e em curso — disse Vance, agradecendo às "corajosas sobreviventes" por denunciarem, e pediu a outras que liguem para uma linha direta de crimes sexuais.
Essas são as primeiras acusações penais contra o ex-produtor de 66 anos, que até agora nega ter mantido relações sexuais "não consentidas".
Desde as publicações das primeiras revelações, mais de 100 mulheres, entre as quais estão atrizes como Angelina Jolie, Salma Hayek, Gwyneth Paltrow e Rose McGowan afirmaram que ele as assediou, que abusou sexualmente delas, ou as estuprou.
Investigações do jornal The New York Times e da revista New Yorker - recompensadas com o Prêmio Pulitzer - revelaram que Weinstein usou seu poder para obrigar jovens atrizes, ou aspirantes a atrizes, a realizar suas fantasias sexuais, algumas vezes contando com a ajuda de seus funcionários e comprando o silêncio das vítimas com acordos de confidencialidade.
Um passo até a justiça
Depois se soube que muitas pessoas sabiam de seu comportamento, mas preferiram permanecer em silêncio por medo de verem suas carreiras arruinadas pela influência do produtor, venerado por ter promovido um cinema autoral encarnado por diretores como Quentin Tarantino.
As revelações geraram um impressionante efeito dominó. Centenas de mulheres começaram a publicar com a hashtag #MeToo seus depoimentos sobre agressões sexuais, muitas vezes sofridas anos antes.
Assim se materializou o poderoso movimento #MeToo, que derrubou muitos homens poderosos em muitas áreas, começando pelo cinema e pela televisão, mas também no mundo da moda, da música, da alta gastronomia e dos meios de comunicação.
Na quinta-feira, o famoso ator Morgan Freeman passou a fazer parte da lista dos acusados, depois que oito mulheres afirmaram que ele as havia assediado sexualmente. Ele se desculpou.
O prisão do produtor após meses de investigação do promotor de Manhattan, acusado de ser pouco diligente neste caso, foi saudada pelo movimento Time's Up, surgido paralelamente para combater o assédio sexual no trabalho.
"Harvey Weinstein destruiu as vidas de um número incalculável de mulheres. Estamos com elas e em solidariedade com as mulheres em todas as partes que enfrentaram locais de trabalho abusivos e inseguros", tuitou o Time's Up.
— Estou em estado de choque — disse a atriz Rose McGowan à ABC nesta sexta-feira. — Devo admitir que não esperava vê-lo algemado algum dia.
No dia anterior, McGowan, que afirma ter sido estuprada por Weinstein no Festival de Cinema de Sundance em 1997, celebrou sua iminente acusação como "mais um passo até a justiça".
— É supercatártico para muitas vítimas — disse Tarana Burke, fundadora do #MeToo. —Talvez estejamos assistindo a uma mudança na forma de tratar os casos de violência sexual.
No sábado passado, durante o encerramento do Festival de Cannes, a atriz italiana Asia Argento, convertida em uma das figuras mais combativas do #MeToo, denunciou duramente Weinstein, alegando que havia sido estuprada por ele durante a edição de 1997 do evento.