Estrela de Westworld, Evan Rachel Wood, 30 anos, contou sua história de anos de violência doméstica e abuso sexual em uma sessão do Congresso americano na última terça-feira (27). Em 2016, em carta publicada no Twitter ela já havia falado sobre o assunto.
A atriz defendeu perante os congressistas a implementação da Declaração dos Direitos Civis para Sobreviventes de Assédio Sexual em todos os 50 Estados dos EUA - atualmente, a lei é válida em apenas nove. A campanha parte do movimento social Rise, uma organização sem fins lucrativos que visa proteger sobreviventes de estupro e assédio sexual através da lei.
- A consequência do estupro é uma parte enorme da conversa que precisa de muito mais atenção, e, neste caso, posso falar pelas minhas próprias experiências. Muitas vezes falamos destes ataques como não mais do que alguns minutos de terror, mas as cicatrizes duram uma vida inteira. Não consigo enfatizar isso o suficiente - disse a atriz.
Evan contou sobre os dois estupros que sofreu e as consequências físicas e psicológicas em decorrência dos casos:
- Mesmo que estas experiências tenham ocorrido há uma década, eu ainda lido com as consequências. Meus relacionamentos sofrem, meus parceiros sofrem, minha saúde mental e física sofre. Sete anos depois dos estupros; fui diagnosticada com TEPT a longo prazo, uma doença com a qual tenho vivido durante todo este tempo sem saber da minha condição. Simplesmente pensava que havia enlouquecido. Lutei contra depressão, vício, agorafobia, terror noturno, muitas vezes alguém que dormia comigo acordava comigo gritando à noite.
Ela ainda falou sobre as tentativas de suicídio e o ponto de virada:
- Lutei contra automutilação, ao ponto de duas tentativas de suicídio que me colocaram em um hospital psiquiátrico por um curto período de tempo. Este foi um ponto de virada na minha vida e quando comecei a buscar ajuda profissional para lidar com o trauma e o desgaste mental. Outras pessoas não têm tanta sorte e, por isso, o estupro é mais do que alguns minutos de trauma, mas uma morte lenta.
Leia o depoimento de Evan Rachel Wood (abaixo, o vídeo com a íntegra, em inglês):
Meu nome é Evan Rachel Wood e sou uma artista. Mas também sou uma sobrevivente de violência doméstica e abuso sexual, e mãe solteira de um menino.
Quando tinha cinco anos comecei a trabalhar em filmes, e todos os dias desde então tenho trabalhado para alcançar o lugar privilegiado que estou ciente de ocupar. Estou aqui hoje para usar minha posição enquanto artista, sobrevivente, mãe e ativista para trazer uma voz humana à população de 25 milhões de sobreviventes nos Estados Unidos que, atualmente, vivem uma situação de desigualdade sob a lei, e que desesperadamente precisam de direitos civis básicos.
Luto para falar com vocês hoje, porque não sei ao certo quais palavras são apropriadas para discutir este assunto. No entanto, se vocês não puderem ouvir a verdade completa, nunca vão entender empatia e acredito no ditado: "Se nós tivemos que vivê-lo, vocês deveriam ouvi-lo."
Neste último ano, os grandes movimentos como o Me Too e o Time's Up foram extremamente empoderadores e validaram sobreviventes, mas também foram incrivelmente difíceis. Embora ninguém precisasse me dizer que estupro é uma epidemia global, ver tantas histórias similares à minha foi ao mesmo tempo libertador e devastador. Ondas de memórias voltavam a cada vez que lia as palavras, "congelei".
Aachava que era a única pessoa a ter passado por isso. Carreguei tanta culpa e dúvida sobre a minha resposta ao abuso. Aceitei minha impotência e senti que merecia aquilo de alguma forma. Por quê? Anos depois de processar e olhar para o passado, finalmente me perguntei, "por que me senti desta forma?"
Há dois momentos específicos de assédio que vivi e realmente ficaram grudados na minha mente. De fato, eles estão gravados no meu cérebro. Marcados para a vida toda, uma cicatriz mental que sinto todos os dias.
Minha experiência de violência doméstica foi essa: abuso tóxico mental, físico e sexual, que começou lento, mas escalou com o tempo, incluindo ameaças à minha vida, gaslighting severo e lavagem cerebral, acordar com o homem que dizia me amar estuprando o que ele achava ser meu corpo inconsciente, e a pior parte, os rituais doentios de prender minhas mãos e pés para ser mental e fisicamente torturada até meu abusador sentir que eu tinha "provado meu amor por ele."
Neste momento, enquanto estava imobilizada, sendo espancada e ouvindo coisas indizíveis, senti que poderia morrer, não apenas porque meu abusador me dizia: "Eu poderia te matar agora". Mas porque, naquele momento, senti como se estivesse saindo do meu corpo. Tinha medo de fugir, e ele me encontrar. Congelei, e foi como se pudesse me ver do lado de fora e, pela primeira vez em meses, senti algo, uma vergonha e um desespero profundos. Não tinha ideia do que fazer para mudar minha situação. Então me senti entorpecida, e logo não conseguia sentir mais nada. Eu não estava viva.
Minha autoestima e meu espírito estavam destruídos. Estava aterrorizada e aquele medo vive comigo até hoje. O que me machuca e me deixa com raiva, mais que o próprio estupro e abuso, é aquele pedaço de mim que foi embora, que alterou o curso da minha vida.
Por causa desse abuso e do meu espírito já despedaçado, quando fui empurrada para o chão e aprisionada em um depósito por outro agressor depois de horas em um bar, meu corpo sabia o que fazer por instinto: desaparecer, se entorpecer, fazer aquilo sumir. Ter sido estuprada e vítima de abuso antes fez com que fosse mais fácil ser estuprada novamente, e não o contrário.
Não passa um dia sem que ouça as palavras que este homem sussurrou no meu ouvido: "Você vai ficar bem, você vai ficar bem, eu prometo, você vai ficar bem". E minha voz fraca dizendo de volta: "Não, não, não, não". Até que me esvaísse em nada. Me lembro do sentimento de me fechar ou "congelar" e do choque tomando conta. Nnão conseguia emitir um som. Senti uma parte de mim desaparecer, uma parte que nunca voltou. Em outras palavras, eu não fiquei bem, eu não estou bem.
Conhecia os sinais. Minha mãe também é uma sobrevivente, mas nem ela foi capaz de proteger a filha das mensagens que homens e mulheres recebem da sociedade, que cumprem um papel a determinar o nosso destino, ou a magia obscura do gaslighting. Algumas vezes não somos diminuídos somente pelos agressores, mas permanecemos lá por causa do conhecimento de que pode não haver um lugar seguro para onde ir.
A consequência do estupro é uma parte enorme da conversa que precisa de muito mais atenção, e, neste caso, posso falar pelas minhas próprias experiências. Muitas vezes falamos destes ataques como não mais do que alguns minutos de terror, mas as cicatrizes duram uma vida inteira. Não consigo enfatizar isso o suficiente.
Mesmo que estas experiências tenham ocorrido há uma década, eu ainda lido com as consequências. Meus relacionamentos sofrem, meus parceiros sofrem, minha saúde mental e física sofre. Sete anos depois dos estupros; fui diagnosticada com TEPT a longo prazo, uma doença com a qual tenho vivido durante todo este tempo sem saber da minha condição. Simplesmente pensava que havia enlouquecido. Lutei contra depressão, vício, agorafobia, terror noturno, muitas vezes alguém que dormia comigo acordava comigo gritando à noite e tentado respirar em uma piscina de suor, depois de algum sonho vívido do meu agressor, ouvindo ele dizer o meu nome tão alto no meu ouvido, ou alucinando uma visão da pessoa parada no canto do meu quarto. O sentimento da paralisia retorna quando há um barulho muito alto ou quando estou em casa sozinha, convencida de que alguém está vindo para me machucar eu passo a noite acordada segurando um taco de beisebol, o que começou a substituir parceiros distraídos ou ausentes à medida que confiança e toque tornaram-se mais e mais difíceis. Lutei contra automutilação, ao ponto de duas tentativas de suicídio que me colocaram em um hospital psiquiátrico por um curto período de tempo. Este foi um ponto de virada na minha vida e quando comecei a buscar ajuda profissional para lidar com o trauma e o desgaste mental. Outras pessoas não têm tanta sorte e, por isso, o estupro é mais do que alguns minutos de trauma, mas uma morte lenta.
Gostaria de dizer aos meus agressores que não os odeio. Sinto pena de vocês. Não estou aqui para humilhar vocês, quero entender vocês e que vocês me entendam, mas vocês precisam ouvir o que tenho a dizer primeiro.
Isso me faz pensar no meu filho, no mundo em que ele vai crescer, e no dia em que terei que explicar a ele o que é estupro e por que isso aconteceu à mãe dele.
Quando soube que seria mãe, rezei por um menino. No entanto, percebi, poderia ser tão fácil para o meu filho cair vítima do que a sociedade nos diz sobre homens. Coisas como "eles têm impulsos incontroláveis de machucar pessoas." Quão cruel é dizer a uma criança que é assim que os homens se comportam e o quão cruel é fingir que não estamos vendo as formas como perpetuamos esta mentira.
Então, estou aqui para falar pelos homens e especialmente pelo meu filho, que espero crescer sabendo que é muito mais importante do que aquilo tudo, e por quem eu espero continuar lutando e dando o exemplo; por ele, por mim mesma, e por todas as pessoas afetadas pelo abuso. Este é o nosso papel como pais e líderes.
Começamos a mudar isso com educação e reconhecimento da humanidade em todos nós, sem importar o status de "homem" ou "sobrevivente". Não apenas em termos médicos, mas em termos de conexão real com outras pessoas.
Acima de tudo, isso começa com as leis. Começa com pessoas dando o exemplo e indo ao auxílio de nossas meninas e também dos nossos meninos, que são tão suscetíveis às mensagens tóxicas que passamos para destruir os espíritos e mudar as vidas DELES e DELAS.
Esta lei é apenas o primeiro passo na direção de expectativas melhores em relação ao que é certo e quais parâmetros vamos esperar enquanto sociedade. O reconhecimento de direitos civis básicos a sobreviventes de assédio e violência sexual serve como primeiro passo, uma rede de proteção que pode salvar a vida de alguém. Isso é progresso e começa aqui.