Mais antiga transformista em atividade no Brasil, Rogéria morreu na noite de segunda-feira (4). Ela estava internada em um hospital na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Abaixo, confira alguns momentos da trajetória da atriz.
Fernanda Montenegro, a incentivadora
Nascida em 1943, no município de Cantagalo (RJ), como Astolfo Barroso Pinto, Rogéria foi criada na capital do Estado, onde recebeu a influência das vedetes do Teatro de Revista. A carreira artística começou nos bastidores, como maquiadora, época em que conheceu a atriz Fernanda Montenegro, que se transformaria em amiga e grande incentivadora. De todas as profissões que exerceu – cantora, atriz, vedete, maquiadora, jurada, modelo e diva –, Rogéria preferia ser chamada de artista.
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Até em Malhação
Fluente em francês, usava o epíteto A Travesti da Família Brasileira para falar de si mesma, muitas vezes na terceira pessoa. O título foi conquistado com muitas horas de aparições no horário nobre da TV. Rogéria esteve em programas de muito sucesso, como Viva a Noite, as novelas Tieta e Duas Caras, o seriado A Grande Família e o humorístico Sai de Baixo. Mais recentemente, participou da novela teen Malhação.
Romances com políticos e jornalistas
No cinema, fez parte do elenco dos longas O Homem que Comprou o Mundo (1968), Gugu, o Bom de Cama (1979), Copacabana (2001) e, recentemente, Divinas Divas, documentário da atriz Leandra Leal sobre a geração que, durante a ditadura, transformaria o entretenimento nacional com um novo gênero de teatro, em que transexuais e transformistas se apresentavam para um público que nunca as tinha visto. Consciente do gênero que embaralhava definições e mentes à epoca – ela se identificava como transformista, mas concedia liberdade poética: "Pode chamar de bicha mesmo", dizia. No ano passado, lançou a biografia Rogéria: Uma Mulher e mais um Pouco, escrita por Marcio Paschoal. No livro, ela revela detalhes picantes dos romances que teve com políticos, empresários, artistas, atletas e jornalistas.
Sem medo da morte
Após um período vivendo em Paris e se apresentando pela Europa, nos últimos anos estava morando em um apartamento no bairro do Leme, no Rio de Janeiro. Rogéria não quis fazer cirurgia para mudar o sexo e nunca colocou silicone para alterar as formas do corpo. Afirmava não se preocupar com debates sobre a representatividade LGBT e era conhecida por brigar com colegas homofóbicos. Ainda que o ativismo contemporâneo não a reconheça – ela não dominava terminologias como transexual e cisgênero, que surgiram após seu sucesso –, Rogéria fez as pazes com a turma:
– Os ativistas são muito importantes. Adoro que eles existam, e defendo até o fim. Mas não é a minha. Vim para divertir. Preciso ser engajada? Se as outras travestis estão aí, é graças a mim.
Cerca de um ano atrás, questionada se tinha medo de morrer, respondeu:
– Meu amor, vivi mais do que qualquer outra. Mais e melhor.
*ZERO HORA