Não se mede o talento e o tamanho de um ator apenas pelo Oscar. Sean Connery, cuja morte, aos 90 anos, foi anunciada neste sábado (31), ganhou apenas uma estatueta dourada em sua carreira de cinco décadas. Foi em sua única indicação ao prêmio entregue pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, na categoria de melhor ator coadjuvante por Os Intocáveis (1987). Neste filme de Brian De Palma, ele interpretou um veterano policial irlandês, Jimmy Malone, que se junta a Elliot Ness (Kevin Costner) no cerco ao chefão da máfia Al Capone (Robert de Niro), na Chicago dos anos 1930.
Mas Connery foi um protagonista. E conquistou, em vida, algo maior do que um troféu: o coração do público.
Com 1m88cm e sua característica voz grave, o escocês foi o primeiro ator a encarnar James Bond no cinema. Nos sete filmes que estrelou entre 1962 e 1983, entre 007 Contra o Satânico Dr. No e Nunca Mais Outra Vez, cristalizou no imaginário popular a figura do espião internacional bom de briga e bom de cama. E idiossincrático em relação a drinques: seu martini tinha de ser "batido, não mexido". Connery emprestou ao agente secreto criado pelo escritor Ian Fleming seu charme másculo - que em 1974 foi plenamente explorado pelo figurino extravagante da ficção científica Zardoz (em que o astro aparece de torso nu, uma espécie de tanga vermelha, botas de cano alto, bigode de Zapata e rabo de cavalo) e que em 1989, quando estava para completar 60 anos, lhe valeu a escolha como o homem vivo mais sexy do mundo, pela revista americana People.
Àquela época, Connery havia empilhado uma série de filmes marcantes, desde Outland - Comando Titânio (1981) até Indiana Jones e a Última Cruzada (1989), como o pai do herói vivido por Harrison Ford. Nesse meio tempo, além de Os Intocáveis, fez também a versão cinematográfica de O Nome da Rosa (1986), o best-seller do escritor italiano Umberto Eco sobre um monge franciscano que investiga assassinatos em um mosteiro remoto.
Nos anos 1990, Connery continuou injetando sua elegância, sua ironia e seu olhar profundo a bons filmes de espionagem e/ou ação - como Caçada ao Outubro Vermelho (1990), A Casa da Rússia (1990) e A Rocha (1996), além do policial Sol Nascente (1993). Seu último papel de destaque foi no simpático drama Encontrando Forrester (2000), e sua despedida diante das câmeras aconteceu na constrangedora aventura A Liga Extraordinária (2003). Depois, só voltaria a atuar como dublador, na animação Sir Billi (2012). Era o fim de uma carreira que inclui Marnie: As Confissões de uma Ladra (1964), de Alfred Hitchcock, e O Homem que Queria Ser Rei (1975), de John Huston, Robin e Marian (1976), de Richard Lester, e Justa Causa (1995), de Arnold Glimcher.
Diz o título de um filme de James Bond da fase Connery que com 007 só se vive duas vezes (1967). Mas o ator escocês é como Ramirez, o guerreiro imortal que interpretou no cultuado Highlander (1986). Só morrerá no dia em que seus fãs perderem a cabeça, ou seja, perderem a memória. Os diamantes são eternos, e Sean Connery também.