Olho para minha mesa de trabalho como certa melancolia. A orquídea vai, o álcool gel fica para os colegas. A mesa precisa a ser desocupada para facilitar a limpeza. Daqui a pouco, vou recolher o material de trabalho e partir para uma experiência inédita em minha já longa vida profissional: o home office. Em bom português, vou trabalhar de casa pelos próximos dias, semanas, meses, talvez. A mudança de rotina faz parte das medidas adotadas pelo Grupo RBS no combate ao combate ao coronavírus. Reduzir o número de pessoas na redação é essencial para reduzir os riscos de contágio.
Nós, jornalistas, somos de uma espécie gregária. Gostamos do contato direto com o colega, do abraço, do beijo no rosto, da discussão da pauta, do comentário sobre as últimas notícias. Não é da nossa natureza trabalhar um em cada canto, mas a situação de emergência exige que mudemos radicalmente nossos hábitos nesse período que ninguém sabe quanto tempo vai durar.
Estou no limiar do grupo de risco. Em agosto, completo 60 anos. Nada mais natural do que estar entre os primeiros que irão trabalhar de casa. Já instalamos o Access, equipamento que me permitirá fazer o Gaúcha Atualidade direto da biblioteca. Com celular, tablet, cadernos e canetas coloridas, está montada minha estação de trabalho. A coluna seguirá contando com a inestimável colaboração do jornalista Paulo Egídio.
Hoje, quando soube que iria trabalhar de casa, marquei uma reunião de família para discutir a reorganização da nossa rotina. Meu marido, escritor, se reveza entre um desktop na biblioteca e um notebook na sala. Minha filha, designer, já faz home office deste o início do ano. Até a semana passada, ia para um coworking duas vezes por semana. Com o avanço do coronavírus, todo o time passou a trabalhar em casa e os contatos são virtuais. Meu filho, também designer, soube nesta segunda que seu quarto vai virar escritório até que o perigo passe.
Para que nosso apartamento não se transforme num pedaço de Saigon, teremos de firmar contratos em família. Pela primeira vez, estaremos os quatro em casa, coisa que só fazíamos nas férias, quando Eduardo e Luiza eram crianças. Agora seremos quatro adultos vivendo uma experiência de confinamento.
Com a certeza de que estamos vivendo um período especial no mundo, decidi escrever um diário e compartilhar com os leitores de GaúchaZH os sentimentos e vivências desses dias de guerra contra um inimigo microscópico, em que nossas casas estarão para a pandemia como os abrigos antiaéreos estiveram para a Segunda Guerra.
A sensação de que a população se prepara para uma guerra ficou evidente quando passei no supermercado para comprar um simples varal. Estacionamento lotado, clientes ensandecidos enchendo carrinhos de leite, arroz, feijão e, principalmente, papel higiênico.
Do apartamento em que vivo desde o ano 2000, seguirei produzindo como se estivesse na redação e dividindo impressões sobre a vida no cativeiro imposto pela pandemia que virou o mundo de pernas para o ar.