Do conjunto de medidas apresentadas nesta terça-feira (5) pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, a que mais resistências deve enfrentar entre deputados e senadores é a que prevê o fim dos pequenos municípios a partir de 2025. A lógica do ministro é irretocável: se uma cidade não tem como se sustentar com os impostos que gera, deve ser absorvida por um município vizinho, de maior porte.
Se o projeto for aprovado, milhares de municípios voltarão a ser distrito. No Rio Grande do Sul, hoje seriam 226. Em consequência, serão extintos milhares de cargos de prefeitos, vereadores e secretários, e poupados milhões de reais com a eliminação dessas estruturas. Esses argumentos atrairão a simpatia de quem não vive nas pequenas comunidades.
Para os que serão afetados pela mudança, a lógica é outra. E as perguntas se multiplicam:
- O que significará perder a autonomia depois de 30, 40, 50 anos?
- Como será depender de uma estrutura administrativa muitas vezes situada a dezenas de quilômetros de distância?
- Significará a volta ao tempo em que a localidade não tinha escola de Ensino Médio, hospital, polícia ou agência bancária?
Pela proposta do ministro, os municípios com até 5 mil habitantes deverão comprovar, até 30 de junho de 2023, sua sustentabilidade financeira. Para esse efeito, a população será a apurada no próximo censo de 2020. O que se entende por sustentabilidade financeira?
O parágrafo 1º do artigo 115 diz que "a sustentabilidade financeira do município é atestada mediante a comprovação de que o respectivo produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 156 da Constituição Federal corresponde a, no mínimo, 10% da sua receita". Por esse entendimento, só valeriam as receitas próprias, de IPTU, Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) ou de transmissão de imóveis.
Embora os municípios recebam 50% do IPVA, esse imposto não estaria contemplado no cálculo dos 10%, assim como o ICMS e o IPI, que retornam de acordo com uma fórmula pela qual os pequenos recebem valor mínimo, não necessariamente proporcional à geração de riqueza. Isso torna mais difícil a comprovação da sustentabilidade financeira. Um município com menos de 5 mil habitantes, sede de uma grande indústria, não está livre de voltar à condição de distrito.
Sem consulta
O município que não comprovar sua sustentabilidade financeira deverá ser incorporado a algum dos seus limítrofes, a partir de 1º de janeiro de 2025. Se for vizinho de três grandes, qual deles incorporará a cidade que perderá autonomia? A proposta não prevê consulta à população: o incorporador será o município com melhor índice de sustentabilidade financeira. Cada município só pode incorporar três novos. Aqui reside um problema prático: vários dos que se emanciparam nos últimos 30 anos e que até hoje não têm 5 mil habitantes nem sustentabilidade financeira estão cercados de cidades de porte semelhante.
A previsível resistência de deputados e senadores tem outro motivo que não o bem-estar da população: prefeitos e vereadores são cabos eleitorais valiosos, que trabalham na campanha contando em ter nas Assembleias, na Câmara e no Senado um representante para defender os interesses da sua região.
Famurs é contra incorporação
Tão logo tomou conhecimento da proposta de Guedes, o presidente da Famurs, Dudu Freire, posicionou-se contra a ideia de extinção de pequenos municípios. Pelas contas da Famurs, dos 231 municípios gaúchos com menos de 5 mil habitantes, 226 têm receita própria menor do que 10% do total, considerando apenas o ITBI, IPTU, ISSQN, taxas e contribuições de melhoria. A média de arrecadação própria desses municípios é de 4,8%.
Ficam fora desta regra apenas cinco municípios com menos de 5 mil habitantes: Capivari do Sul, Monte Belo do Sul, Coxilha, São João Polêsine e Arambaré.
— A proposta não representa um pacto federativo justo, que valorize os municípios. O projeto foi construído de cima para baixo, sem ouvir as entidades representativas.