Escrever sobre as férias era uma das tarefas mais ingratas na minha infância e adolescência, porque nunca tinha o que contar. Agora, que viajo duas vezes por ano, sinto prazer em compartilhar experiências que podem interessar aos leitores deste espaço. Nestas férias de inverno, quitei uma dívida que tinha comigo e fui conhecer um pedacinho da Bahia – Salvador e Morro de São Paulo. Outra parte gastei na Festa Literária de Paraty, a Flip, que havia me conquistado na edição de 2016. É possível que volte a falar destas férias nos próximos domingos, porque há muito a dizer sobre a Bahia de Todos os Santos e a Paraty da prosa e da poesia, mas vou começar pela casa de Jorge Amado e Zélia Gattai, hoje transformada em memorial.
A Casa do Rio Vermelho é uma construção de adobe, no bairro do mesmo nome. Endereço: Rua Alagoinhas, 33. Aqui, a realidade se conecta com a ficção de Jorge Amado: a numeração das casas da Alagoinhas não segue qualquer ordem. Ao lado do 700 pode estar o 440 e, logo adiante, o 930. A rua é cheia de curvas e para chegar ao 33 é importante saber dessa desordem para não desistir antes de chegar ao jardim onde estão enterradas as cinzas de Jorge e Zélia, perto dos banquinhos em que os dois costumavam sentar à sombra de uma mangueira.
O ingresso para entrar no mundo do grande escritor baiano custa de R$ 20. Pode-se optar pela visita guiada por um historiador (minha opção) ou conhecer cada cômodo por conta própria. Lá está a sala em que ele escrevia, na cabeceira da mesa de jantar, com a velha máquina Royal protegida por uma redoma de vidro. No quarto de hóspedes, a cama onde dormiram amigos que só conhecemos dos livros, como o compadre Pablo Neruda, e as camisas floreadas de que o baiano tanto gostava.
A Casa do Rio Vermelho é um museu diferente. A história da vida de Jorge, Zélia e dos filhos Paloma e João Jorge é contada não só nas peças em exposição, que incluem coleções de objetos acumulados nas viagens ao redor do mundo, mas em farto material audiovisual a que o visitante pode passar horas assistindo. No vídeo que roda na TV da antiga cozinha, Dadá, a cozinheira preferida de Jorge Amado, ensina a preparar as mais tradicionais receitas da culinária baiana.
Em um dos cômodos estão expostas cartas que Jorge Amado recebeu de colegas de ofício. Detive-me na gaveta que exibe uma de Erico Verissimo, outro gigante da literatura. Qualquer dia destes, vou contar uma história que ouvi de Paloma sobre a conversa dos dois sobre os filhos João Jorge Amado e Luis Fernando Verissimo, chamados nas cartas de "o meu João e o seu João".