Faz sentido um governo que encampa o discurso de crise financeira e encaminha um pacote com medidas de ajuste fiscal – com extinções de órgãos públicos, inclusive – aprovar um projeto que criará despesa extra de R$ 30 milhões por ano? Pois foi isso que ocorreu na Assembleia na semana passada, em meio à votação do pacotaço do Executivo.
Uma emenda assinada pelo líder do governo, Gabriel Souza (PMDB), e aprovada pelo plenário, permitirá que os papiloscopistas tenham os salários dobrados ao serem equiparados aos peritos criminais. A emenda foi protocolada em meio à discussão de um projeto do Executivo que alterava o regime de dedicação exclusiva dos funcionários do Instituto-Geral de Perícias (IGP). À primeira vista, parecia algo inocente, já que apenas alterava a nomenclatura dos papiloscopistas, chamados agora de peritos papiloscopistas. Na prática, trata-se de um aumento salarial disfarçado.
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Nos bastidores da Assembleia, a tese para a aprovação do texto, que teve o voto contrário apenas de Marcel van Hattem (PP), é de que um deputado pressionou o Piratini e condicionou o seu apoio ao pacote à aprovação da emenda por ter interesses pessoais com ela. ZH procurou o deputado Sergio Peres (PRB) para ouvir as suas explicações, mas não o encontrou até o encerramento desta edição. Embora a emenda tenha sido rejeitada por outros parlamentares, somente Van Hattem votou contra no mérito do projeto.
– Foi surpreendente, uma emenda que chegou em cima da hora. Votei contra porque está sendo criada uma vantagem indevida em relação ao que foi proposto no concurso público. Creio que é inconstitucional e creio que o governador vai vetar – afirma Van Hattem.
O valor que será desembolsado para pagar os 320 papiloscopistas promovidos às vésperas do Natal seria suficiente para manter ao ano a Fundação de Economia e Estatística (FEE) e os seus 180 funcionários, por exemplo, ou a Fundação Piratini (TVE e FM Cultura) e 247 empregados.
É fundamental que a base do governo (e os deputados da oposição, que também votaram a favor) esclareçam afinal qual foi o acordo que permitiu a votação de um projeto que aumenta despesas em R$ 30 milhões enquanto ceifavam 11 órgãos públicos e mais de 1,2 mil empregos nas sessões da última semana.