A tragédia do assassinato de uma mãe diante da filha adolescente acordou o governo de José Ivo Sartori de um sono de 600 dias. Por mais que os gaúchos batessem bumbo alertando para a crise da segurança pública, o governador e seu secretário Wantuir Jacini mantinham uma postura que aos cidadãos indignados parecia conformismo. Mesmo com os números apontando para o crescimento dos latrocínios, Sartori e Jacini, em dueto, garantiam que a política de segurança estava no rumo certo.
A morte da médica Graziela Lerias e do porteiro José Luis Godinho do Sacramento, no Dia dos Pais, desencadeou uma onda de protestos no Estado e de inconformidade no coração do governo. Em reuniões internas, o vice-governador José Paulo Cairoli cobrava providências e alertava para a necessidade de uma guinada na política de segurança e na forma de a secretaria se comunicar. Antes disso, o secretário da Fazenda, Giovani Feltes, cobrava uma postura mais proativa do secretário Jacini, mas ele convencia Sartori de que seu plano estratégico, mesmo prejudicado pela carência de recursos, acabaria por debelar a onda de violência.
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Quando Sartori viajou para a Argentina, Cairoli ficou em seu lugar, e a segurança dominou a agenda no Piratini. Cairoli convocou os comandantes de cada área e o próprio Jacini para reuniões em que cobrava, principalmente, mudança na forma de comunicar o que está sendo feito e de reagir diante dos problemas.
No início da noite de quinta-feira, a repercussão da morte de Cristine Fonseca Fagundes transformou uma reunião de rotina no Palácio Piratini no embrião do gabinete de crise, que ficará sob o comando de Cairoli por tempo indeterminado. O vice-governador, que há algum tempo chegou a sugerir a extinção da secretaria, para que o comandante da Brigada e o chefe de Polícia respondessem diretamente ao governador, é, agora, o responsável pela área mais delicada do governo.
A mudança de estilo é radical e agrada aos setores que consideram esgotado o discurso pessimista e querem apagar a imagem de que o governo está paralisado. A avaliação preliminar é de que não convém substituir o chefe de Polícia, Emerson Wendt, nem o comandante da BM, coronel Alfeu Freitas. Que o problema estava na postura excessivamente defensiva do secretário, reproduzida pelo governador em suas manifestações.
Oficialmente, foi Jacini quem pediu demissão. Ninguém disse "você está demitido", como Donald Trump em seu antigo programa de TV. Os sinais de que seu ciclo chegara ao fim eram tão claros, que o secretário se viu compelido a colocar o cargo à disposição. Sem pestanejar, Cairoli aceitou o pedido de saída. Sartori, que resistia em demitir o homem escolhido para a segurança na formação do governo e elogiado pela lealdade, havia dado carta-branca ao vice-governador para fazer o que precisasse ser feito.
Aliás
O governo não tem pressa em indicar um secretário para a Segurança. A definição do novo titular deverá ocorrer no bojo de uma reforma mais ampla do primeiro escalão, mas existe a possibilidade de a área seguir sob o comando de Cairoli.