Ao anunciar a correção da tabela do Imposto de Renda em 5%, a presidente Dilma Rousseff não fez nem a obrigação, que seria reajustar pela inflação. Ao elevar o benefício médio do Bolsa Família em 9%, Dilma apenas materializou o que estava previsto no Orçamento de 2016, aprovado no ano passado. Por que, então, as críticas dos aliados do vice-presidente Michel Temer, como o sindicalista Paulinho da Força, líder do partido Solidariedade, que chamou o "pacote de bondades" de "ato de desespero"?
Os adversários perceberam que Dilma está fazendo política. Ela sabe que seu mandato está por um fio e quer deixar boas lembranças na memória dos eleitores fiéis. Quer, também, constranger Temer, que no seu ajuste fiscal poderá revogar as duas medidas, mas terá de arcar com a repercussão negativa entre os atingidos. No caso do Imposto de Renda, significará desagradar à mesma classe média que foi às ruas para dizer "Fora, Dilma". No caso do Bolsa Família, é comprar briga com uma fatia do eleitorado que foi decisiva para a eleição e a reeleição da presidente.
Algoz de Dilma, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, disse que o reajuste do Bolsa Família é uma "irresponsabilidade fiscal" e que o déficit projetado para 2016 é de R$ 96 bilhões. Aliados de Temer dizem que não é hora de corrigir a tabela do Imposto de Renda, embora todos concordem que está defasada. A não correção da tabela é uma forma disfarçada de aumentar imposto. Mantêm-se as alíquotas, mas não se corrige a base de cálculo pela inflação e o assalariado acaba pagando mais. O governo Fernando Henrique Cardoso foi, nos últimos anos, o que por mais tempo manteve a tabela congelada (de 1997 a 2001).
Dilma escolheu data e local simbólicos para o que pode ter sido sua despedida diante de uma multidão: o 1º de Maio no Vale do Anhangabaú, em São Paulo, organizado pela Central Única dos Trabalhadores. Repetiu o discurso que vem fazendo diariamente nas últimas semanas: que está sendo vítima de um golpe, que não roubou e não tem contas no Exterior. A presidente não discursou para os senadores, a quem caberá decidir seu destino, mas para os eleitores. Na festa do Dia do Trabalho, a ausência mais notada foi a do ex-presidente Lula, que alegou problemas na garganta para não participar do ato. Lula perdeu a voz.