Em seu segundo mandato, o deputado federal Carlos Gomes (Republicanos) foi escolhido, na terça-feira (7), coordenador da bancada gaúcha no Congresso, em Brasília.
Ele ficará à frente do grupo de 31 deputados e três senadores do Estado em 2023. Será o responsável por representar os interesses do Rio Grande do Sul no Congresso e junto ao governo Lula. Pastor evangélico, Gomes terá como vice a deputada Any Ortiz (Cidadania). Ele substitui Giovani Cherini (PL), que ficou oito anos à frente do grupo.
Em entrevista à coluna, o baiano radicado no Rio Grande do Sul comenta o desafio de coordenar os parlamentares gaúchos nas tratativas com o governo Lula, fala sobre a estiagem no Estado e sobre a descoberta do trabalho análogo à escravidão em Bento Gonçalves, na Serra.
Leia os principais trechos.
Como o senhor pretende coordenar uma bancada com tantos partidos e ideologias diferentes e no ambiente de polarização em que vivemos? O que os une?
Se você for olhar para partidos e suas ideologias, você não vai a lugar algum. O que me move a fazer política e o que me move a aceitar o desafio de ser coordenador da bancada é olhar para as pessoas e para o nosso Estado, diante de tantos desafios que temos pela frente e de tantas obras que temos de lutar para que possam ser concluídas. Há muitas coisas boas pelas quais temos de lutar. Essas coisas boas é o que nos une. É ver o bem-estar dos gaúchos e gaúchas. O que me move são os pontos de convergência e deixar de lado os pontos de divergências, porque, se você ficar parado ali, discutindo, vai morrer e não vai produzir nada.
Alguma chance de votar a favor do governo caso os assuntos de interesse do Rio Grande do Sul estejam envolvidos?
Quem me acompanha sabe: as minhas ações sempre são pautadas acima de governo e oposição. São pautadas em torno de projetos. Eu, particularmente, nunca fiz oposição a governos. Posso me opor a posturas, a modos de procedimentos, fórmulas, mas a partidos, não. Repito: temos de ser a favor de boas práticas, e contra aquelas que sabemos que vão produzir péssimos resultados. O Republicanos, a nível nacional, não é oposição. Também não é situação. Somos independentes, e isso nos permite trafegar entre diversos partidos. A minha postura, que me credencia junto aos meus colegas parlamentares, é uma relação fraterna, respeitosa, construtiva, e creio que foi isso que levou os colegas a me elegerem como coordenador da bancada para esse ano de 2023.
Há poucos gaúchos no alto escalão do governo Lula. Isso pode complicar a interlocução dos deputados e senadores do Estado com o Executivo e a defesa dos interesses do RS?
Não acredito. Até porque sabemos que o PT trabalha por alas. Nessa questão do governo, quem dá a diretriz é o presidente. A minha relação, enquanto líder de bancada, é institucional, porque represento o meu Estado. E, dentro dessa relação, o RS, por si mesmo, por tudo o que contribui para o cenário nacional, não só politicamente, mas também devido ao que o governo federal arrecada no Estado, e pelo que o Estado contribui na sua produção e isso vale para agricultura, comércio e indústria, requer um respeito e uma atenção devida.
Falando em agricultura, como contribuir para amenizar a estiagem?
São 34 parlamentares. E todos eles têm voto no Senado e na Câmara. Nenhum governo, no início, meio ou fim, quer atrito. Todos os governos prezam pela paz para ter governabilidade. O RS se impõe pelo seu tamanho e importância, e a agricultura do Brasil passa pelo RS. Se estamos vivendo uma estiagem, que causou perdas e prejuízos não só para os gaúchos, mas para todo o país, isso mexe com a economia nacional. Nacionalmente, tem de haver preocupação com o Estado. Os ministros estiveram no RS, olhando e acompanhando a estiagem, já anunciaram R$ 430 milhões, e o próprio ministro (da Agricultura Carlos Fávaro) reconheceu que seria insuficiente. Portanto, cabe ao RS, alinhado a sua bancada, manter um trabalho para termos atenção do governo federal para que ele possa revisar esses valores de acordo com a necessidade.
Além de R$ 430 milhões ser pouco, o governador Eduardo Leite veio a Brasília, mas não foi recebido pelo presidente Lula. Não falta mais atenção ao Estado?
A visita que fizeram ao RS foi para conhecer in loco a situação. Eles (os representantes do Executivo) não poderiam sair sem anunciar nada. Diante de tudo o que viram, tinham de anunciar algo. O próprio ministro, que esteve em Não-me-Toque, reconheceu que não é suficiente, mas que isso pode ser revisado. É essa revisão que temos de acompanhar, tanto o governador Eduardo e sua equipe como também a bancada gaúcha.
O senhor é baiano, terra da maioria dos trabalhadores que sofreu o trabalho análogo à escravidão em Bento Gonçalves. O que pode ser feito para que não se repita?
Foi um ponto isolado. A repercussão do fato foi maior do que os fatos. Não que o fato não mereça a atenção devida. Tem de tratar o fato com a sua devida atenção, isolar, não massacrar um setor tão importante, para nosso Estado, para mais de 20 mil produtores de uvas, que temos sucos maravilhosos, o melhor espumante do mundo, tantas coisas boas derivadas da uva. Temos de ter um pouco mais de responsabilidade em algumas linhas editoriais com esse setor. E aí peço ajuda da imprensa: que possa separar o fato, e dar repercussão devida ao fato, e a gente não prejudicar esse setor. Porque é um setor que nos é muito caro, divulga muito o RS, muitos turistas vão ao Estado para conhecer a serra gaúcha, sobretudo esse setor do enoturismo, e que também cresceu muito em qualidade dos nossos vinhos. Me sinto triste pelo episódio que aconteceu com o grupo de trabalhadores. Repito: merece a sua atenção. Mas não podemos penalizar todo um setor porque duas empresas não tiveram o cuidado de acompanhar outra empresa contratada. Penso que precisamos dar atenção devida a isso para não prejudicar. Enquanto baiano, sou solidário aos trabalhadores, se não tiveram atenção devida, mas também sou solidário a uma história de trabalho, dos nossos imigrantes que chegaram na primeira colônia e começaram a fazer essa cultura do nosso Estado, prosperaram na pedra, elevaram a serra gaúcha, o nosso RS, a nossa economia. Respeito muito, e quero que sejam protegidos porque a gente não pode prejudicar todo um setor em função de um ponto isolado, que merece atenção e correção adequada.
Como o senhor pretende ampliar o acesso das entidades gaúchas aos parlamentares do Estado em Brasília?
Meu desejo seria mudar o estatuto da bancada gaúcha e criar dois coordenadores adjuntos mais dois secretários. Pelo estatuto é um coordenador e um adjunto, que hoje é a deputada Any Ortiz. Independentemente dessa configuração, eu irei fazer com que cada parlamentar possa ser mais participativo e tenha mais protagonismo nas ações. É um Estado muito grande, são muitas demandas, muitas frentes de trabalho, e temos muitos bons deputados federais e senadores que podem encapar frentes, de acordo com o chamado e a necessidade, para que possamos designá-los a fim de que cada parlamentar possa estar acompanhando frentes de trabalho e trazer relatórios e encaminhamentos para bancada. E assim a gente vai democratizando o acesso à bancada gaúcha e dando mais celeridade às soluções.