As autoridades de Bruxelas e de Londres negam, os diplomatas se esquivam, mas o que começa a se desenhar na Europa é a primeira batalha comercial da era pós-Brexit, cujo processo foi concluído em 31 de dezembro de 2020. No mais novo capítulo da chamada guerra das vacinas, a União Europeia ameaça bloquear a exportação de 40 milhões de doses do produto da Pfizer/BioNTech para o Reino Unido. Seria uma retaliação do bloco europeu ao anúncio do laboratório AstraZeneca, que produz a vacina de Oxford, de que só poderá entregar 25% das 100 milhões de doses encomendadas pela UE.
As vacinas da americana Pfizer/BioNTech são produzidas na Bélgica e, de lá, partem para o Reino Unido.
Em sua defesa, a AstraZeneca diz que o governo britânico foi mais rápido ao fazer os pedidos. Há também diferenças nos contratos da empresa com o Reino Unido e com a UE, que negocia em nome de todos os 27 países do bloco.
- O contrato com o Reino Unido foi assinado primeiro e o Reino Unido, claro, disse: "Vocês nos fornecem primeiro". E isso é justo. Nosso contrato com a UE não estabelece um compromisso. É um esforço. Basicamente, dissemos que iriamos dar nosso melhor, mas não podemos garantir que vamos conseguir. Na verdade, estamos um pouco atrasados - afirmou o CEO da AstraZeneca, Pascal Soriot, ao jornal italiano La Repubblica.
O governo britânico tem tentado se manter afastado da briga para evitar que o tema seja tratado como uma disputa política entre o Reino Unido e a UE, agora que o país não mais integra o bloco europeu. Também não quer dar um aspecto nacionalista à briga entre as empresas. As palavras têm sido milimetricamente medidas, na intenção de garantir sua própria cobertura vacinal, oferecer à UE uma imagem de empatia e se apresentar como protagonista na defesa do multilateralismo e da cooperação internacional.
- Tudo o que posso dizer é que temos muita confiança na segurança de nossos produtos e nos contratos firmados. Com essas bases seguimos com os planos. É um assunto (a disputa comercial) a ser resolvido entre as partes (UE e AstraZeneca) - afirmou, de forma lacônica, o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson.
Mas os jornais sensacionalistas já provocam com manchetes que apelam ao nacionalismo: "Espera tua vez! Uma egoísta UE quer nossas vacinas", dizia o Daily Express. "Não, a UE não pode ter nossas vacinas!", afirmava o Daily Mail.
Primeiro país do Ocidente a iniciar a vacinação, em 8 de dezembro, o Reino Unido atingiu até agora 11,25% da população vacinada, segundo o monitor de Oxford. Já entre os 27 países do bloco europeu, a imunização segue muito lentamente (na Espanha, apenas 1,74% da população foi imunizada, por exemplo). A UE fez encomendas de diversos fabricantes, mas os dois principais atrasaram a entrega - a própria Pfizer/BioNTech tem enfrentado dificuldades de produção.