Rodrigo Lopes

Aeronave ucraniana

A terrível admissão do Irã faz aflorar a revolta de se saber que, na guerra, os civis são as principais vítimas

A semana mais tensa do Oriente Médio em anos tinha tudo para terminar com o alívio de uma guerra que não se concretizou, mas trouxe um turbilhão de sentimentos

Rodrigo Lopes

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AFP / AFP
Os manuais militares costumam dizer: se há dúvida, não atire

A mais terrível madrugada da história recente do Oriente Médio começou com a chuva de foguetes e mísseis sobre o deserto iraquiano e terminou com um avião civil abatido em Teerã cinco horas depois. O mesmo cuidado que os aiatolás tiveram ao escolher alvos nas bases de Al-Asad e Erbil, de forma que não provocassem vítimas fatais entre americanos — o que poderia levar a uma guerra total com os Estados Unidos — não se revelou na sucessão de decisões subsequentes dos oficiais iranianos, quando suas forças armadas estavam em alerta máximo à espera de uma retaliação.

Aeroportos são considerados alvos estratégicos — os primeiros a serem neutralizados em uma ação inimiga em caso de ataque para negar ao adversário decolagem de aviões de combate. Também é onde ficam centrais de comunicação fundamentais para operações estratégicas. É usual ainda, em vários países, como no Brasil, bases aéreas estarem coladas aos terminais civiis — e aviões das forças aéreas e da aviação comercial compartilharem a mesma pista. Os arredores do aeroporto Iman Khomeini, de Teerã, de onde decolou o jato ucraniano abatido provavelmente por um artefato Tor M-1, abriga várias instalações da Guarda Revolucionária, que os iranianos ao tentarem justificar o erro, dizem que era um "delicado centro militar".

Por tudo isso, seria compreensível que o Irã imaginasse que o aeroporto seria um dos primeiros alvos de uma resposta americana a seu ataque às bases no Iraque. Explica, mas não justifica o erro. Que comandante militar, em sã consciência, ordenaria o abate de um avião civil com 176 pessoas a bordo? Os manuais militares costumam dizer: se há dúvida, não atire.

A semana mais tensa do Oriente Médio em anos tinha tudo para terminar com o alívio de uma guerra que não se concretizou, com um ataque milimetricamente planejado para não fazer vítimas — e apenas dar "um susto", criar imagens e fatos para saciar o público interno dos aiatolás que cobrava vingança, e para Donald Trump e os aiatolás se refestelarem com suas vitórias inventadas para seus eleitores.

Ao contrário, a admissão terrível do Irã de que abateu o avião traz, para quem acompanha o noticiário internacional, um turbilhão de sentimentos que vai além da dor e da sensação de impotência. Aflora a revolta de se saber que em guerras, dos tempos passados ou da atualidade, são os civis as principais vítimas.

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