Os aiatolás jogaram combustível na fogueira ao anunciar nesta segunda-feira (1º) que o Irã superou o limite autorizado de suas reservas de urânio pouco enriquecido, imposto pelo acordo nuclear de 2015. Era tudo o que os falcões da Casa Branca queriam para soprar com mais força no ouvido de Donald Trump que só um ataque é capaz de frear a ambição nuclear iraniana.
O presidente americano saiu em maio de forma unilateral do tratado, acusando o país de desrespeitar o acordo. Não havia evidências de ruptura por parte dos aiatolás. Agora, há. Ao cruzar a linha vermelha dos 300 quilos permitidos de urânio, o Irã corre o risco de ser acusado, pela primeira vez com razão, de descumprir seus compromissos internacionais.
O governo iraniano se considera no direito de não respeitar o tratado desde a decisão de Trump. O próximo passo — aí, sim, a pá de cal no acordo — seria o país retomar as atividades de enriquecimento de urânio a uma porcentagem maior do que o máximo estabelecido (3,67%). Isso pode acontecer a qualquer momento. O governo também já deu mostras de que irá retomar a construção do reator de água pesada na usina de Arak, se os demais países que continuam no acordo (Alemanha, China, França, Grã-Bretanha e Rússia) não ajudarem a contornar as sanções americanas. Arak, aliás, seria um dos primeiros alvos americanos em caso de guerra.
Concluído em julho de 2015, no governo de Barack Obama, o acordo internacional sobre o programa nuclear iraniano, cujo nome oficial é Joint Comprehensive Plan of Action (JCPOA) está a perigo desde a saída americana. Mas agora há motivos para preocupação. O anúncio ocorre em um contexto de tensões com o governo americano e do quase ataque de junho. A situação se deteriorou no dia 20, depois que o Irã derrubou um drone dos Estados Unidos. É verdade que tudo isso pode não passar de barganha do regime iraniano para despertar em Trump a mesma atenção dispensada a Kim Jong-un. O problema é que, no caso do Irã, as questões são infinitamente mais sensíveis do que na Península Coreana: por interesses em jogo, o fator Rússia, terrorismo e localização estratégica econômica e política. No Oriente Médio, qualquer fagulha tem muito mais potencial de explosão.