Há várias formas de se morrer em uma guerra. E a maneira como pereceu Shifa Gardi, repórter da emissora de TV curda Rudaw, é uma das mais terríveis. Dentro de um carro, no meio de um comboio cercado por forças militares, um ambiente que transmite uma falsa sensação de segurança ao jornalista no front. De repente, bum! Uma mina na beira da estrada, no caso de Shifa, ou de um RPG, e o carro vira um forno incandescente.
Em maio do ano passado, estive em um comboio desses, como o que Shifa estava no Iraque. No meu caso, era Ramadi, ao sul de Mossul. Como enviado de Zero Hora, a ideia era mostrar a cidade do Triângulo Sunita recém libertada das mãos do grupo terrorista Estado Islâmico. Dentro do Humvee do exército iraquiano, a sensação é de inviolabilidade, porque o veículo é à prova de balas, e, ao mesmo tempo, de vulnerabilidade total: você está inserido (embedded) nas tropas, logo, é visto também como inimigo pelos terroristas. Em um eventual ataque ao comboio, morrem todos.
A todo momento, você pensa: "O que farei, se o carro for incendiado?" A porta é pesada demais. Não há tempo para fugir.
Shifa, 30 anos, era mulher em um ambiente duplamente dominado por homens: o do jornalismo no Oriente Médio e, principalmente, o dos correspondentes de guerra.
Felizmente, em minhas andanças por zonas conflagradas, observo que isso começa a mudar. Cada vez mais repórteres mulheres estão trabalhando na cobertura de conflitos. Em 2012, entrei na Líbia ao lado de uma equipe de TV da Associated Press majoritariamente integrada por produtoras e repórteres. Algo semelhante observei no Iraque, em 2016, e no Líbano, em 2012, este último um dos países mais liberais da região.
O Brasil é pródigo em repórteres experientes em zonas de conflito, como Adriana Carranca, Patrícia Campos Mello, Deborah Berlink e a fotógrafa Alice Martins. É mais um muro que cai graças ao trabalho sério dessas colegas brasileiras e de profissionais internacionais como Shifa.
Veja abaixo um pouco do trabalho da repórter, que, apesar de jovem, estava habituada ao front.