Você já deve ter visto a foto acima na sua timeline nos últimos dias. Caso ela não tenha pipocado ainda no seu Facebook, Twitter ou Instagram, pare agora de ler este texto e repare...
Percebeu? Todos os jovens estão de costas para Hillary Clinton, a candidata democrata à Casa Branca. Mostrei essa imagem a um colega, nesta tarde, na Redação de ZH.
- Por que eles estão de costas? - questionou meu amigo.
Fazem uma selfie - respondi.
Sim, mas não uma selfie comum. A imagem acima, flagrante de Barbara Kinney, fotógrafa oficial da campanha democrata, é mais do que o registro da maratona eleitoral de Hillary para sucessão de Barack Obama. É o retrato de um tempo, está sendo comparada a duas outras fotografias que registram não apenas os avanços tecnológicos a que testemunhamos, mas principalmente a concretude de como nos comportamos diante dos fatos, da história e da perenidade do tempo. A foto abaixo, registro da enorme fila no Vaticano, em 2005, para o velório do papa João Paulo II, é mostrada com freqüência por especialistas em comunicação e tecnologia em palestras para ilustrar a sutil, mas revolucionária passagem de um mundo analógico para o digital e da conquista do mundo pelos smartphones.
A comparação normalmente feita nas palestras sobre os avanços do mundo digital é feita com outra imagem do Vaticano, da renúncia de Bento XVI e conclave do papa Francisco. Veja:
Estive nos dois eventos, como repórter do Grupo RBS, e posso testemunhar: em 2005, entrei ao vivo na Rádio Gaúcha no momento em que pisei nos degraus da Basílica de São Pedro após uma madrugada inteira na fila. Falei por um telefone analógico, daqueles antigos, com o estúdio em Porto Alegre durante uns 10 minutos. Sem fotos em tempo real. Em 2012, quando cobri a renúncia de Bento XVI, transmiti ao vivo a cerimônia de despedida com um smartphone, as imagens do papamóvel de Ratzinger percorrendo a Praça de São Pedro pela última vez.
Nesta terça-feira, ao conhecer os bastidores da foto de Hillary e dos jovens de costas ultrapassamos outra barreira: não é mais contemplação, nem tampouco registro instantâneo. Somos o fato e nós dentro dele, eternizados (será?) em uma selfie. Não basta registrar Hillary – poderia ser Trump. É preciso estar com ela – ou ele - dentro do fato. Isso é a selfie.
A imagem foi tirada no último dia 21 de setembro em Orlando, na Flórida. Segundo a rede BBC, cerca de 500 pessoas não conseguiram entrar no comício de Hillary. A candidata, ao final do evento, foi saudar o público que ficou lá fora.
- Todos que quiserem uma selfie, virem-se de costas agora – disse.
Os eleitores obedeceram: viraram-se, sacaram seus smartphones e registraram Hillary, o fato e, claro, a si mesmos. Fez-se ali um (vários!) retrato (s) do nosso tempo.