Vocês sabem: se eu disser que Lula é bandido, dirão que adoro Alckmin.
Ou que a mídia é golpista.
Ou que defendo interesses do meu patrão.
Ou seja, não posso considerar Lula bandido mesmo entendendo que todas as evidências mostram que Lula é bandido. Preciso ter sempre segundas intenções.
Mas suponhamos que, no fundo, no fundo, Lula seja bandido. Andei analisando com esmero o processo do triplex do Guarujá, que pode tirar o ex-presidente da eleição se ele for condenado em segunda instância. Não vou me ater aqui aos outros cinco processos em que Lula é réu, nem às outras três denúncias apresentadas contra ele. Digamos que tudo seja parte de uma conspiração para extirpá-lo da política brasileira – o que me parece improvável, porque o processo do sítio em Atibaia é ainda mais avassalador do que o do triplex. Mas tudo bem, aceito por ora a hipótese da conspiração, portanto falarei estritamente sobre o caso do triplex.
Parece-me haver duas possibilidades para alguém defender com absoluta convicção a inocência de Lula:
1) Estar desinformado. Ou seja, não conhecer o processo.
2) Sofrer justamente daquele distúrbio de que me acusarão se eu disser que Lula é bandido: segundas intenções. Porque, vão me desculpar, por trás de uma inviolável convicção sobre a inocência de Lula, só pode haver segunda intenção.
Provavelmente, intenção de afirmar-se como alguém "de esquerda". Ou como alguém que valoriza os feitos de Lula como presidente. Ou como alguém que jamais apoiaria candidatos da linhagem de Alckmin, Marina ou – cruz credo – Bolsonaro.
Só que ainda não entendo por que, no momento atual, não pode uma pessoa ser de esquerda, elogiar alguns méritos do governo petista, abominar Bolsonaro e, ainda assim, reconhecer as evidências de que Lula pode ser culpado. Não entendo por que uma coisa precisa contradizer as outras.
Você dedica algumas horas para conhecer o processo do triplex e, por favor!, lá está um sócio da OAS – não um corretor de imóveis qualquer, mas um sócio da OAS, construtora que prestava serviços para o governo Dilma – negociando um apartamento com o ex-presidente da República, e lá estão as provas de que uma imensa reforma no local foi orientada por dona Marisa, e lá estão as provas de que a ex-primeira-dama também escolheu a cozinha instalada naquele triplex. Agora me diga, quem é que manda reformar um apartamento e depois diz, olha, na verdade, pensando bem, não vou ficar com esse apartamento?
Talvez isso ocorra.
E talvez você acredite sinceramente nisso – eu não acredito –, mas até você deverá concordar que "o homem mais honesto do Brasil", como Lula afirma ser, jamais estabeleceria relação tão promíscua e nojenta com uma construtora que prestava serviços para o seu governo. Se você discorda disso, bem, então já deve ter certeza de que eu adoro Alckmin, que a mídia é golpista e que atuo em defesa do meu patrão.