De forma discreta e com alguns claros problemas de comunicação, o Itamaraty vai buscando se reaprumar e recuperar algum protagonismo, retomando a visibilidade que vem se apagando. O agora ex-ministro das Relações Exteriores José Serra parecia preocupado com isso. Andou se aproveitando da reunião de chanceleres do G-20 em Bonn para, por exemplo, encontrar-se com o colega mexicano, Luis Videgaray. Tudo muito discreto. Claro que Serra apoiou estrategicamente o México nas suas atuais contendas com os Estados Unidos e, seguindo a atual orientação pragmática, procurou incentivar a aproximação da Aliança do Pacífico (bloco integrado por Chile, Colômbia, México e Peru) com o Mercosul (Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai). Isso para não falar nas gestões feitas com a União Europeia (UE) por um acordo de livre comércio negociado já há duas décadas – a resistência vinha da Venezuela e da Argentina kirchnerista. A Venezuela está afastada do bloco, e a Argentina mudou de mando. Com a Rússia, os dados serão jogados na visita de Michel Temer a Moscou em algum dia de 2017.
No mínimo, o que há é uma forte mudança no perfil do Itamaraty. Há menos ações no terreno político e mais no comercial, menos busca de liderança explícita e mais trabalho discreto, tirando a política da agenda. Diplomatas dizem que há dois elementos importantes: comunicação contida, com menos alarde, e busca pela atuação mais eficiente no aspecto comercial, mais técnica. Talvez isso tenha se somado à dor nas costas de Serra para sobrecarregar um homem que entrou no governo Temer flertando com as eleições presidenciais de 2018.
Com os EUA de Donald Trump, também há contatos para negócios. Tudo discreto, tudo nos bastidores e mirando no longo prazo. Diz o professor de Relações Internacionais da Fundação Getulio Vargas (FGV) Matias Spektor: Temer "pretende apresentar a Trump um cardápio de propostas de cooperação. Assunto prioritário é a negociação de um acordo, que se arrasta há 15 anos, para autorizar empresas americanas a contratarem serviços de lançamento de satélites na base militar de Alcântara, no Maranhão". Assunto prioritário e polêmico. A intenção é gerar recursos para retomar o programa espacial brasileiro. Claro, as críticas da oposição enveredam pela ideia de que há, ali, entreguismo. Politicamente, isso favoreceria um chanceler com pretensões políticas?
Nos últimos meses, houve alguma estranheza por conta dos contatos feitos pelo novo presidente americano, Donald Trump. O porta-voz da Casa Branca, Sean Spicer, teve de esclarecer que o presidente dos EUA ainda não conversou com Temer por questão de "agenda". Desde que tomou posse, em 20 de janeiro, o líder americano já conversou com os colegas da Argentina, Mauricio Macri; da Colômbia, Juan Manuel Santos; e do Peru, Pedro Pablo Kuczynski. O vice-presidente dos EUA, Mike Pence, falou ao telefone com Temer na semana passada. Spicer explicou que ainda haverá um telefonema de Trump a Temer. Na conversa de cinco minutos com Macri, Trump o chamou de "liderança", o convidou a ir até Washington e enviou efusivamente abraços para seu pai, Franco Macri. E o telefone de Temer ainda não tocou.