Vejam bem...
O Nicolás Maduro mantém a Venezuela naquela crise horrorosa e inclassificável, em que as pessoas vibram ao conseguir um quilo de farinha, açúcar ou arroz após meio ano de procura e morrem por não ter medicamentos, num absurdo desabastecimento de 80%. No próximo fim de semana, você terá essa dramática e caótica situação contada em detalhes no caderno Doc, de Zero Hora (reportagem minha após ter passado toda a semana passada em Caracas).
Em quem Maduro põe a culpa? No "imperialismo" dos EUA e nas empresas que o boicotam, num grande complô internacional. Ora... o cara que diz isso nem se dá conta de que o atual presidente americano é Barack Obama. Sabe quem é, né? Aquele que reatou relações com Cuba? Veja bem, reatou relações com Cuba!
Só que essa tática de pôr a culpa na grande potência mundial é mais abrangente do que pode parecer e não respeita ideologias. Os EUA, com seus defeitos e qualidades (viva a cultura ocidental, com suas grandes conquistas nos direitos civis...), são o culpado de plantão. Daquela que se diz "esquerda" (Maduro é mesmo de esquerda?!) e daquela que, claramente, é a direita mais clássica.
Claro: deve-se fazer uma ressalva. Os EUA estiveram, sim, por trás de muitos descalabros, em especial na América Latina. Sabemos disso. Só que esse histórico nada elevado dá margem a todo tipo de álibi. E aí é ruim...
Por que digo tudo isso?
Porque o ex-presidente da Colômbia Álvaro Uribe questionou nesta terça-feira a participação do enviado especial dos EUA nos diálogos com as Farc, Bernard Aronson, e sugeriu que ele tem "interesses comerciais" para apoiar a paz.
Pronto! Os EUA são os culpados.
Aiii!!! Descobri uma unha encravada! Os EUA são os culpados!
Uribe, ferrenho opositor às negociações com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, promovidas pelo governo do desafeto Juan Manuel Santos, questionou em um comunicado os possíveis motivos econômicos do representante de Washington para promover o fim do conflito com o principal e mais antigo grupo rebelde do continente. "Que interesses comerciais teve, ou tem, o senhor Aronson em companhias que foram concessionárias para explorar recursos naturais da Colômbia em zonas que voltaram ao domínio das Farc, ou vinculadas à indústria do café com parceiros próximos ao presidente da República?", escreveu o incrivelmente tortuoso Uribe.
O ex-presidente (2002-2010), que liderou a maior ofensiva militar contra as Farc, argumentou que a guerrilha avançou nos últimos anos em seu domínio territorial. "Muitos acreditam (...) que para salvar seus interesses econômicos tinham que facilitar a ascensão das tiranias neocomunistas, que sacrificaram a democracia, as liberdades econômicas e as reivindicações dos pobres", acrescentou, citando a Venezuela como "o caso mais recente".
Ex-subsecretário de Estado para a América Latina com vasta experiência na resolução de conflitos em El Salvador e na Nicarágua, Aronson foi nomeado em fevereiro de 2015 pelo governo americano para acompanhar as negociações de paz com as Farc. Esse diálogo ociorre desde novembro de 2012 em Cuba para pôr fim a meio século de violência. Conforme o portal colombiano de informação La Silla Vacía, o diplomata e empresário é, por intermédio de sua companhia de capital privado Acon Investments, o principal acionista da petroleira Vetra, que explora poços nos departamentos colombianos de Putumayo e Meta. Além disso, tem investimentos no setor de saneamento e água e em empresas financeiras. Amparado nisso, o atual senador Uribe destacou que "Aronson favorece a total impunidade" dos chefes das Farc e promove sua elegibilidade política, apesar de ter repetido que o comandante extraditado dessa guerrilha, Simón Trinidad, preso nos EUA pelo sequestro de três americanos, cumprirá sentença na prisão.
Uribe criticou que Aronson repita "em privado" que a decisão de se pronunciar sobre os acordos em uma eventual consulta para referendar o pactuado "é dos colombianos", mas que, na "imprensa", peça a eles que "votem a favor".
O ex-presidente colombiano também questionou a campanha liderada por Santos para esse plebiscito, em que denunciou ameaças, uso de recursos do Estado para publicizar o voto positivo e uma pressão "aberta e sutil" às forças armadas, "embora a regra democrática as exclua da deliberação política".