Não sou propriamente um observador de pássaros, mas venho notando nos últimos dias o comportamento atípico de alguns bandos que frequentam a zona sul da Capital. Antes, era raro ver uma caturrita. Agora, há dezenas delas. Quando ocupam seus condomínios instalados em coqueiros, eucaliptos e outras árvores altas, ninguém dorme nas proximidades. São escandalosas, conversam aos gritos e – dizem os especialistas – têm talento para imitar a voz humana. As que tenho encontrado, felizmente, falam apenas a língua das caturritas, pois eu jamais me recuperaria do choque se encontrasse alguma discursando como uma ministra do Supremo.
Como não tenho lavoura, as caturritas não me incomodam. Até me divirto ao vê-las em animadas excursões aéreas quando caminho pela orla do Guaíba. O mesmo não posso dizer dos urubus, que vêm invadindo sistematicamente as areias de Ipanema, Espírito Santo e Guarujá. Eles dão um aspecto lúgubre e repugnante a recantos que até pouco tempo atrás eram belos e aprazíveis. Claro que a culpa não é deles. Estão lá porque encontram alimento, especialmente restos de animais lançados na praia por maus cidadãos.
O próprio Darwin, que era um naturalista, descreveu os urubus sul-americanos como "aves nojentas que se divertem na podridão". Na verdade, porém, os pássaros pretos nos prestam um grande serviço ao eliminar as bactérias do lixo, com seus estômagos poderosos. O problema é que onde tem urubu tem mau cheiro. E é preciso muita coragem para pisar na areia que serviu de toalha para seus banquetes.
A população de abutres aumentou tanto na beira do rio (para eles, não faz diferença se é lago ou estuário), que já tem até urubu pousando em galho verde, quando se sabe que eles preferem os ramos secos. Desconfio de que, por questões de saúde pública, cedo ou tarde haverá algum tipo de controle sobre eles. Mas é impensável maltratá-los. São aves silvestres protegidas pela legislação e só ocupam espaço porque as pessoas descartam restos orgânicos em locais impróprios.
Embora não seja um observador profissional, sou um admirador dos pássaros. Aves costumam ser animais inteligentes e criativos, algumas manipulam (ou bicopulam, se é que existe esta palavra) objetos com grande habilidade. Meu pátio já foi frequentado por um bem-te-vi que roubava a ração do cachorro do vizinho e ia quebrá-la no nosso varal de estender roupas, batendo repetidas vezes com o grão numa barra de metal. Outro dia, li sobre um corvo japonês flagrado na atividade de deixar cair uma castanha numa avenida movimentada e esperar pacientemente pelo sinal vermelho para apanhar as partes despedaçadas pelos pneus dos carros.
Os urubus do Ipanema não parecem ter tanta criatividade. Passam o tempo todo disputando seu manjar putrefato, brigam uns com os outros pelos nacos mais suculentos e, no final da tarde, disputam espaço nos galhos secos das proximidades. Porém, menos criativos do que eles – e certamente mais repulsivos – são os humanos que transformam recantos atraentes da nossa cidade em malcheirosos depósitos de lixo.