Ouça aqui a coluna de Marta Sfredo
A maior tesourada no juro desde março de 2009 poderia ter sido ainda maior não fosse a turbulência provocada pela Lista de Fachin. O Banco Central cortou nesta quarta-feira um ponto percentual na taxa básica, para 11,25% ao ano. Curiosamente, é o mesmo nível para o qual a referência caiu em março de 2009, quando houve poda ainda mais drástica,, de 1,5 ponto percentual.
Alexandre Espírito Santo, economista da Órama Investimentos, avalia que, se a redução tivesse sido de 1,25 ponto percentual, o BC não surpreenderia o mercado. Atribui a postura mais cautelosa ao cenário de riscos formado por eventuais impactos dos 74 inquéritos na votação das reformas e à sacudida recente no arranjo global com o ataque americano à Síria:
– É como em dietas, é melhor ir perdendo gordura com o tempo, não muito rapidamente, para evitar efeitos colaterais. Com a divulgação da lista, está todo mundo ainda tentando entendender a abrangência do impacto no ritmo da votação das reformas.
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Está escrito na justificativa do BC para o corte, até mais longa do que as anteriores. A instituição fez questão de destacar que "a aprovação e implementação das reformas, notadamente as de natureza fiscal, e de ajustes na economia são relevantes para a sustentabilidade da desinflação e para a redução da taxa de juros estrutural".
Não precisa nem falar banco-centralês para entender que, com reformas aprovadas, haverá mais espaço para cortes de juro mais acentuados. E o BC também se vacinou contra o excesso de expectativa: "a recuperação da economia pode ser mais (ou menos) demorada e gradual do que a antecipada". Desta vez, houve poucas pistas sobre o futuro das decisões do Copom: "a extensão do ciclo de flexibilização monetária dependerá das estimativas da taxa de juros estrutural". Ficou nublado até para definir as coordenadas.
Na avaliação de Espírito Santo, a relativa impavidez do mercado diante da lista é "uma audácia" – a bolsa recuou 0,73% e o dólar até cedeu 0,32%, na carona de novas declarações de Donald Trump sobre o "dólar muito forte":
– Está tudo muito quieto, muito tranquilo no mercado. Isso me causa surpresa, me deixa com um pé atrás.
Para o economista, a grande incerteza, agora, será sobre o futuro da votação das reformas no Congresso esvaziado e focado nas defesas dos alvos de investigação da Operação Lava-Jato. Se houver algum sinal de avanço, avalia, o BC não vai parar de reduzir o juro – deve repetir a dose de um ponto a menos na próxima reunião, em 31 de maio – neste ano e avançar ainda em 2018. Mas como a instituição já mostrou uma dose extra de cautela, tudo depende dos efeitos da lista.