Aprovada a proposta de emenda constitucional que fixa limites para os gastos públicos, o governo federal tem, se não um cheque em branco, ao menos um ao portador. O teto da inflação medida pelo IPCA vale para o valor global do orçamento. A definição de onde vão ocorrer os cortes será dada no embate entre o Executivo e o Congresso – se a reforma da Previdência permitir escolher. Dadas as suspeitas que hoje pairam sobre um e outro, convém afiar a vigilância.
Se o governo foi arrogante e apressado ao definir o rito de aprovação da PEC do Teto, a oposição não contribuiu para adicionar racionalidade ao debate sobre a proposta. A discussão se a PEC é "da morte" ou "da vida" é simplista e não prepara os brasileiros para seu real impacto.
Não haverá, necessariamente, redução de gastos com saúde e educação. Mas haverá cortes, sim, e será preciso fiscalizar o embate sobre a escolha a cada proposta de orçamento anual. Enquanto uma turma acusa a PEC de sufocar os serviços públicos, outra reclama que é excessivamente gradual.
O aperto não ocorrerá no curto prazo. Na educação, a regra atual será mantida em 2017, com garatia de 18% da receita líquida. Na saúde, a PEC antecipa para 2017 a ampliação do comprometimento de 15% da receita, em vez dos 13,2% previstos. Então, não há problema? Não exatamente.
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Para ilustrar o que vai ocorrer na disputa sobre a despesa, o especialista em contas públicas Raul Velloso usou a imagem de um "cercado com bois bravos, em que os técnicos do Ministério da Fazenda serão os vaqueiros":
– Os bois bravos vão ficar se batendo. Vai ser assim a disputa dentro do Congresso.
O custo de não controlar o gasto público é alto: para sustentar o nível atual, sem a receita equivalente, o governo elevou a dívida pública. Quanto mais dívida o cliente tem, mais o credor cobra. O risco era desembocar no cenário de hiperinflação da década de 1980. Agora, a obrigação do governo é impedir que as previsões mais pessimistas sobre os efeitos da PEC se confirmem: que os mais pobres sejam os principais atingidos por seus efeitos.