Nem a mudança de metade da diretoria do Banco Central (BC), depois da transmissão de cargo do gaúcho Alexandre Tombini para o carioca Ilan Goldfajn surpreendeu no dia da troca de guarda na instituição chamada de ''autoridade monetária''. No discurso de Ilan, consistente mas sem grandes novidades, o que mais chamou a atenção foi a sem-cerimônia para anunciar o que ele mesmo chamou de ''o velho e bom tripé macroeconômico'' – responsabilidade fiscal, controle da inflação e câmbio flutuante.
Na visão do novo presidente do BC, foi esse trio o responsável pela ascensão econômica e social em ''passado não muito distante''. Ilan também manifestou total conforto com o foco único da instituição no Brasil: assegurar a estabilidade do poder de compra da moeda e um sistema financeiro sólido e eficiente.
Durante a formação do governo interino de Michel Temer, chegou a haver especulações sobre a ampliação da autonomia com adoção de duplo mandato, como nos Estados Unidos, onde o Federal Reserve é convocado a manter um olho no gato e outro no peixe, isto é, atenção à inflação e ao emprego. Pobre Ilan se justo agora, quando a taxa de desemprego decola e a de inflação teima em ficar muito acima do teto permitido à instituição, tivesse de dar conta das duas missões.
Ilan só surpreendeu ao corrigir uma intepretação do mercado sobre suas declarações na sabatina na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado há uma semana. Ao frisar seu credo no regime de câmbio flutuante, em princípio, foi entendido como um opositor de mecanismos de estabilização da moeda. Ontem, esclareceu: ''Sem ferir o regime de câmbio flutuante, o BC poderá utilizar com parcimônia as ferramentas cambiais de que dispõe''. Deixou a frase para o final da manifestação, justo antes dos agradecimentos, mas fez questão de esclarecer que pode intervir. Afinal, é bom de comunicação, mas não vai facilitar a vida de especulador.
Quem mais surpreendeu acabou sendo Tombini, que passa a ser representante do Brasil no Fundo Monetário Internacional (FMI). Em seu discurso, atacou a política fiscal do governo Dilma, que responsabilizou por levar a ''aumento significativo do prêmio de risco do país, que se transmitiu negativamente aos preços de nossos ativos, em particular na taxa de câmbio''. Também apontou ''falta de uma política fiscal consistente no país'', queixando-se do fato de que ''coube quase que exclusivamente à política monetária o custo do enfrentamento de fortes pressões inflacionárias''. E terminou com um recado atual, ao dizer que ''o crucial e imprescindível ajuste fiscal não se desenvolveu, até recentemente, na direção e na intensidade necessárias''. Recado dado.