A sátira política voltou a sambar na Marquês de Sapucaí no Carnaval deste ano. Depois de uma forte — e necessária — provocação trazida pela Mangueira, a segunda noite de desfiles do Grupo Especial do Rio de Janeiro trouxe a figura do presidente Jair Bolsonaro para o enredo da São Clemente, com direito a imitação primorosa de Marcelo Adnet e as flexões fake do presidente da República. Com integrantes "laranjas" na bateria, a escola entrou na avenida e narrou fatos históricos envolvendo política e corrupção, com destaque para a construção do chamado "jeitinho" brasileiro.
Adnet, que é também um dos autores do samba da São Clemente, afirmou ao jornal O Globo que o enredo "dialoga com o momento atual e tem tudo a ver com o que a gente está vivendo". "Hoje, o vigário de gravata / Abençoa a mamata / Lobo em pele de cordeiro / Trago em três dias seu amor / La garantia soy yo", cantou a ecola. com direito a "arminha" com a mão e flexões mal feitas. Bordões de apoiadores de Bolsonaro, como "A Terra é plana" e "Acabou a mamata", também estavam presentes entre integrantes da escola na Sapucaí.
Na primeira noite de desfiles na Sapucaí, a Mangueira já havia trazido uma visão carregada de crítica sobre a forma como são tratados negros, mulheres e índios — e cujo samba foi interpretado como uma crítica velada ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido). O enredo contava a história de um Jesus de "rosto negro, sangue índio e corpo de mulher". Ainda na avenida, a Portela trouxe verso que foi interpretado como dirigido ao presidente. "Favela, pega a visão / Não tem futuro sem partilha / Nem messias de arma na mão", dizia a letra da escola verde e rosa. Messias é o nome do meio do presidente.
A ex-candidata a vice na chapa de Fernando Haddad à presidência da República, Manuela D'Ávila (PCdoB), adversária de Bolsonaro no segundo turno da eleição, fez referência ao desfile da verde e rosa nas redes: " Negro e jovem, crucificado e cravado de balas, o enredo da Mangueira buscou a reflexão: e se Jesus nascesse hoje?".