O fantasma da invisibilidade deprime a todos, e de maneira mais contundente aos que, em algum momento, estiveram sob holofotes. Perguntem a um artista de sucesso o que mais o incomoda e ele dirá: a falta de privacidade. Agora questionem um velho ator aposentado do que mais sente saudade e, de olhos marejados, ele confessará: do assédio dos fãs. Muitos ex-atores, segregados no Retiro dos Artistas, com uma tristeza de doer pendurada no olhar, muitas vezes se queixam da falta de generosidade da morte que bem podia ter chegado antes que se fechassem as cortinas.
Mais dramática do que essa previsível obscuridade no acaso da vida é a que relatam alguns velhinhos ao se sentirem excluídos dos projetos familiares, seja porque não ouvem tão bem e as pessoas se cansam de repetir, ou porque as pernas menos obedientes não acompanham o ritmo do pessoal, que depois de um tempo não consegue mais disfarçar o incômodo do estorvo.
Mas existe outro tipo de invisibilidade, mais infame e mais cruel, o da insignificância. Dele se magoam as pessoas humildes, essas que executam tarefas tão simples que ninguém vê. Os melhores gestores aprenderam por experiência que toda a grande empresa que depreciar como secundárias aquelas funções que podem ser cumpridas por pessoas com menor tempo de treinamento começará a ruir nos seus alicerces. E esses tipos, indispensáveis para o andamento da máquina, algumas vezes se revelam vitais.
Naquela sexta-feira, o engenheiro de alimentos resolveu dar uma última olhada na temperatura da câmara frigorífica antes de sair para o fim de semana. O desespero bateu quando se deu conta de que a porta de aço tinha fechado sozinha. Tentou acionar o sistema de alarme, bateu, gritou e, desesperado, sentou no canto mais distante do ponto de saída do fluxo gelado. E o tempo foi passando e, com isso, a certeza de que morreria.
Três horas depois, quando tremia o corpo todo e já nem sentia mais as extremidades, de repente a porta se abriu, e entrou o porteiro da empresa, com sua cara preta sorridente. Tratada a hipotermia, perguntou ao seu salvador:
"O que te levou a abrir a porta da câmara, depois de tanto tempo que todos já tinham ido embora?"
"Ah, doutor, nem sei como é que vou lhe explicar, mas o senhor é o único aqui na empresa que me cumprimenta na chegada e na saída. Eu lembrava com certeza do seu bom dia e, então, quando senti falta do seu boa noite, soube que tinha acontecido uma coisa muito ruim, e saí a lhe procurar!"