Ex-presidente da República mais popular das últimas décadas, Luiz Inácio Lula da Silva teve sua biografia bastante arranhada na denúncia oferecida nesta quarta-feira pelo Ministério Público Federal (MPF). A intenção parece ter sido de arrasar práticas que ocorreram durante seus dois governos.
Os procuradores da República denunciaram Lula por corrupção e lavagem de dinheiro referente a um só episódio, a posse de um triplex na praia do Guarujá (SP), que teria sido bancado e mobiliado pela OAS. Mas, na essência, as 149 páginas da denúncia fazem um inventário de irregularidades que extrapola em muito a suposta ocultação de um imóvel (cuja posse é negada pelo ex-presidente).
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O MPF é draconiano. Para cada um dos 64 pagamentos mensais pela guarda de objetivos de Lula num depósito (custo esse bancado pela construtora OAS), o ex-presidente terá de responder por lavagem de dinheiro. Ou seja, 64 lavagens continuadas. Duro também é o enquadramento para o apartamento e os móveis que Lula teria recebido da empreiteira. Para os procuradores, representam mais de R$ 1,5 milhão "fruto a corrupção".
A denúncia descreve Lula como uma espécie de gênio do mal. O cabeça de uma engrenagem criada para direcionar benefícios ao alto escalão da administração pública federal e aos partidos que a integram. Esse círculo enriqueceu "e teve seus projetos de poder alavancados por polpudas somas monetárias, desequilibrando pleitos eleitorais e afetando uma face da democracia pela disputa eleitoral com candidatos alavancados com o financiamento a partir de recursos ilícitos".
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Alguns trechos da denúncia soam apocalípticos e não se limitam a investigar um imóvel. Aproveitam a oportunidade para atacar todo tipo de prática negativa que atribuem a Lula. Responsabilizam o ex-presidente tanto pelo mensalão (a compra de partidos para formar maioria no Congresso entre 2003 e 2006) como pelo petrolão (coleta de propinas oriundas de contratos da Petrobras). Para os procuradores, se José Dirceu era o "chefe da quadrilha" do mensalão, Lula é o "grande general do esquema criminoso".
Aliás, o petrolão é objeto de uma investigação própria, que corre na Procuradoria-Geral da República, em Brasília. Mesmo assim, os procuradores que atuam no MPF em Curitiba decidiram dar seu recado sobre esse assunto, pulando etapas. Para eles, Lula é culpado e deve responder como chefe dos desvios da Petrobras – o tríplex seria apenas um detalhe num mar de irregularidades.
"Como se apurou, a corrupção sistêmica, além de persistir, foi incrementada mesmo após a saída formal de José Dirceu (ex-ministro da Casa Civil) do governo. Notadamente porque o comandante da estrutura criminosa não era ele, mas sim o próprio Lula", acrescentam os procuradores.