
Com prejuízos à atividade de pesca sobretudo em General Câmara, na Região Carbonífera, a proliferação de piranhas vermelhas, da espécie Serrasalmus maculatus, segue no radar de preocupação do Estado. Do ponto de vista técnico, a questão vem sendo coordenada pelo Ibama, com parceria da Secretaria de Meio Ambiente e Infraestrutura e municípios. Um dos primeiros passos é identificar onde há registros do problema. O órgão federal está acionando as prefeituras para fazer a coleta de informação o mais rápido possível, explica o analista ambiental Maurício Vieira de Souza.
Reunidos, esses dados serão encaminhados para que especialistas no tema possam buscar respostas. Neste momento, os relatos de presença da palometa, como também é conhecida, estão em um raio de 150 quilômetros de distância no curso do Jacuí, entre Cachoeira do Sul e General Câmara. Souza explica que o que está acontecendo é a chamada invasão biológica. A espécie em questão é nativa, mas não nessa e, sim, na bacia do Rio Uruguai. Em algum momento, acabou "cruzando" para o novo ambiente.
— Esse evento é recente. Estamos justamente em um momento crítico, de a coisa estar acontecendo — completa o analista ambiental do Ibama.
Diretor do Instituo de Meio Ambiente da PUCRS, o professor Nelson Fontoura completa que, do ponto de vista técnico, ninguém sabe ainda a quantidade de piranhas existentes. E que após a introdução de uma espécie costuma haver um desequilíbrio:
— As vezes, quando temos uma espécie invasora, existe um ciclo de expansão bem grande.
O que vem depois é que pode variar: a dificuldade de instalação das invasoras pode ser maior ou menor. Podem não sobreviver e desaparecer. Ou acabar tendo uma intensidade muito baixa. Outras, depois da explosão, chegam a um ponto de um equilíbrio.
— Não acredito em medidas controladoras da população. A piranha vem, deve ficar e teremos de aprender a conviver com ela. Já existe na bacia do Uruguai, onde há um polo importante de pesca — acrescenta Fontoura.
Para que o pescador possa enfrentar esse processo, o diretor entende que é importante algum tipo de auxílio. A alternativa é buscada em General Câmara. O prefeito Helton Barreto participou de reunião com a Secretaria de Pesca do Ministério da Agricultura e tenta recursos via Ministério da Cidadania. A mesmo tempo, prepara a minuta para a criação de um benefício municipal, caso não seja possível acessar a verba da União. Mas ressalta que, neste caso, o fôlego financeiro seria menor.
Questões em aberto
1) Como houve a invasão da espécie da bacia do Uruguai para o Jacuí?
Essa informação ainda precisa ser confirmada. Uma das hipóteses é de que tenha acontecido na confluência dos rios Ibicuí e Vacacaí.
2) Como fazer o controle?
O predador natural desse tipo de piranha é o dourado. A espécie, no entanto, está ameaçada de extinção. Diretor do Instituto de Meio Ambiente da PUCRS, Nelson Fontoura pontua que "fazer repovoamento de dourado é sempre bom". Mas pondera que normalmente isso é feito a partir de matrizes iguais:
— Pode ser interessante se for feito com cuidado utilizando matrizes diferentes.
Analista ambiental do Ibama no RS, Maurício Souza explica que existe um plano nacional, a partir de resolução de 2018, que trata da estratégia nacional do combate a espécie exóticas.
3) Pode chegar ao Guaíba?
Especialistas dizem que sim. Da mesma forma como foi introduzida no Jacuí, pode chegar ao Guaíba.
4) Como os pescadores podem evitar perdas?
Uma das formas é fazendo o manejo da pesca, revisando as redes lançadas na água em intervalos menores de tempo, a cada duas horas.
5) Quais as características da piranha vermelha (também chamada de palometa)?
- Tamanho: na fase adulta fica, em média, em torno de 20 centímetros, podendo passar de 25 centímetros
- Peso: depende do tamanho, mas em geral, é de cerca de 250 gramas no adulto
- Reprodução: têm ciclo reprodutivo anual. A desova é feita em margens de corpos d'água, em águas calmas, rasas e em geral com vegetação aquática, galhos, pedras e outros abrigos. A fêmea cuida dos ovos até a eclosão. Podem viver até 20 anos, e maturam com aproximadamente dois anos
- Ambiente: nativa do RS, a espécie ocorre desde a região do prata (bacia do rio Uruguai e Paraná, com ocorrência no Uruguai, Argentina e indo até Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, São Paulo, com registro até a bacia do rio São Francisco). Em outros Estados, é como pirambeba ou piranha branca
- Preador natural: na fase adulta, jacarés, ariranhas, lontras ou outros peixes também predadores, como o dourado, traíra, trairão ou elas próprias, pois há canibalismo registrado. Como é um peixe topo de cadeia alimentar, a piranha é predadora por natureza. A predação por outros peixes, no entanto, ocorre mais na fase em que é juvenil, de menor porte
Fontes: Maurício Souza (Ibama), Nelson Fontoura (PUCRS), João Sampaio (Emater) e Rodrigo Beheregaray (Sema), que desenvolveu mestrado em Aspectos da Biologia da Piranha
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