A pobreza caracteriza a campanha eleitoral à Prefeitura de Porto Alegre. Não se trata, porém, de pobreza por "falta de dinheiro" (como alegam os políticos) nem da propaganda comedida, que só é comedida na aparência. Não se trata de renúncia à opulência e ao fausto (pois aí integraria a caridade, uma das virtudes teologais), mas – sim – da miserabilidade de ideias, da incapacidade de apresentar projetos concretos sobre o amanhã.
Já no primeiro turno, com nove aspirantes ao trono de rei-municipal, a pobreza dominou. Agora, na escolha entre apenas dois, quando ideias e projetos efetivos deveriam estar lapidados, continuamos a ver só pedras brutas ou a própria rocha nua.
Se depender do que os dois candidatos dizem na TV, o futuro da Capital é o ar. Sim, o ar soprado sobre nós pelos dois M – Marchezan e Melo.
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Proclamam e prometem apenas intenções ou ideias a esmo que qualquer um pode ter (do grande especialista ao alienado rapazote do crack) e tão rarefeitas como lufadas de ar. Mas o ar traz também a pestilência da antiga celulose sueca, hoje chilena, vinda da outra margem do rio, atenuada mas ainda presente.
Já no primeiro turno, ninguém tratou da água que chega às torneiras. O mau cheiro e sabor acre diminuíram, mas o prefeito nunca explicou a causa nem os candidatos tocaram no desastre. A pretensa "solução" limitou-se a cancelar o contrato da empresa que tratava a água retirada da área mais poluída do rio...
O Guaíba esteve ausente dos debates, como se não existisse. A ciência moderna insiste na urgência de defender o ambiente natural e indica caminhos, mas o Rio Grande continua a pensar e agir como nos séculos 18 e 19, quando "progresso" era destruir o meio ambiente, acabar com o verde, poluir terra, água e ar.
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Nenhum candidato viu o aeromóvel como transporte rápido, limpo e barato. Nem sequer para desafogar a Ipiranga, já com área apropriada para erguer a rede de trilhos e levar milhares de pessoas até a PUC e o Hospital São Lucas.
Esse trem, que nosso engenheiro Coester desenvolveu, é avançado demais para ser entendido pela mentalidade burocrática dos políticos. É silencioso, não usa combustível contaminante, não suborna ninguém. É construído por empresas daqui, não por grandes multinacionais que nos infestam de ruidosos ônibus de fuligem preta e, assim, precisam dar algo mais...
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Sem apresentar propostas concretas do que pretendem realizar, nenhum dos M – nem Marchezan nem Melo – sequer nos dizem qual seria o primeiro ato como prefeito.
A bandeira de Marchezan é "mudança", mas dito sempre em sentido genérico, sem apontar o que mudar, ou como e onde, com que instrumentos e recursos financeiros e humanos. Só varinha mágica de bruxa muda desse jeito, pelo pensamento!
A bandeira de Melo tem dois lados opostos. Em um, é a continuidade e espelho do atual prefeito. Em outro, se diz "o novo". Fará tudo o que o prefeito não fez e que ele (o vice) não viu.
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Não se veem propostas objetivas sobre o que mudar ou fazer. Assim, em vez de visões sobre como fazer aquilo que (genericamente e sem especificar) dizem que vão fazer, ambos nos oferecem música. Sempre musiquinhas fáceis e pegadiças, em que Marchezan rima com "amanhã" e Melo com "belo", mas que nada definem nem orientam o eleitor.
E aí o desrespeito é profundo, mesmo que não se note. A função do eleitor é cantar e cantar? Ou é conhecer os candidatos?
No Dia da Criança, na TV, os dois apelaram à inocência infantil. Melo apareceu numa escola, abraçou, prometeu e indagou da gurizada e da professora. Marchezan sentou-se num parque com crianças e perguntou: "Quem se levanta cedo?", "Quem gosta de chocolate?", em melosa e simpática publicidade para sensibilizar pais e mães, mas que era encenação teatral tão postiça e demagógica quanto a do oponente.
Antes, quantas vezes Melo inspecionou escolas e viu crianças? Quantas Marchezan reuniu-se com crianças num parque?
O eleitor é o único titular do voto e merece respeito. Não pode ser tratado como tolo ou boneco. Tenham respeito, senhores!
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