Do início de janeiro ao fim de junho deste ano, a Organização Mundial da Saúde contou mais de 7 mil casos da doença, confirmados com exames laboratoriais, em mais de 60 países.
Assim que surgiram os primeiros doentes na Europa e nos Estados Unidos, o vírus foi sequenciado. A análise das sequências encontradas mostrou que apresentavam grande semelhança com as do vírus que circulava há décadas em países do Oeste da África, como a Nigéria, associada à mortalidade inferior a 1%. Enquanto o vírus que circula nos países do Centro da África, como a República Popular do Congo, a mortalidade chega a 10%.
Esses dados sugerem ser provável que o primeiro paciente do surto atual tenha adquirido o vírus no Oeste africano. Situação semelhante à ocorrida nos pacientes diagnosticados fora da África nos surtos de 2018 e 2019.
Alguns virologistas aventam a hipótese de que o vírus já circulasse nos Estados Unidos e na Europa silenciosamente, sem ser detectado. É pouco provável ter permanecido sem diagnóstico um vírus que provoca lesões de pele tão características da varíola.
A revista Nature faz três perguntas sobre o surto atual:
1) Uma alteração genética poderia explicar os últimos surtos?
Há 17 anos, os virologistas estudam a evolução dos poxvírus com o objetivo de identificar os genes responsáveis pela agressividade e pela transmissibilidade da cepa da África Central, em relação à do Oeste do continente, sem encontrar explicação.
Comparado ao de outros vírus o genoma dos poxvírus é muito grande: mais de seis vezes maior do que o do SARS-CoV-2. Portanto, muito mais difícil de se estudar.
Além dessa dificuldade, as agências de pesquisa nunca fizeram esforços para financiar pesquisas na área da epidemiologia genômica, para sequenciar o vírus enquanto circulava apenas na África. Essa lacuna dificulta as comparações da cepa atual como as anteriores.
Sabemos que o vírus infecta roedores, esquilos e ratos, mas ainda não foi possível identificar o reservatório natural nos países da África mais afetados.
2) O surto atual pode ser contido?
Até aqui, não faz sentido vacinar a população. A opinião dos especialistas é unânime: vacinar apenas os contactantes nos quatro primeiros dias após o contato com a pessoa infectada. Como o período de incubação vai de cinco a 21 dias, há tempo para estimular a imunidade antes da instalação da doença. O fato de a vacina ser administrada em dose única é outra vantagem em relação àquelas que exigem doses de reforço.
Embora considerem muito baixa a probabilidade de transmissão para animais domésticos, as autoridades europeias recomendam que roedores de estimação, como os hamsters e as cobaias de pessoas com a doença, sejam encaminhados aos serviços de saúde pública para observação. Esse cuidado é importante, porque nos animais a doença pode se manifestar sem lesões visíveis na pele.
3) No surto atual, o vírus se dissemina de forma diferente?
A transmissão ocorre pelo contato íntimo com as lesões, líquidos corpóreos e gotículas respiratórias da pessoa infectada.
Tem chamado a atenção os casos em homens que fazem sexo com homens, desde que foram descritos os casos ocorridos depois de raves na Espanha e na Bélgica. Esse vínculo entre atividade sexual e a doença não prova que o vírus seja sexualmente transmissível, porque o ato sexual é uma situação que provoca contato íntimo com a pele infectada.
Uma das principais diferenças do vírus em relação ao SARS-CoV-2 é a de que os poxvírus permanecem viáveis por vários dias em superfícies, como lençóis, cobertores, maçanetas, torneiras etc.