Jesus Cristo morreu aos 33 anos. Apesar da morte trágica, não viveu muito menos do que seus contemporâneos; no Império Romano, poucos chegavam aos 40 anos de idade.
Depois da morte de Jesus, muitos séculos se passaram sem que houvesse aumento significativo na duração média de vida da espécie humana. Em 1900, nos países mais ricos da Europa e nos Estados Unidos, a expectativa de vida ao nascer ainda estava abaixo de 50 anos.
Então, veio o século 20. Nele, o desenvolvimento tecnológico da agropecuária e os avanços científicos da biologia (que conduziram às noções modernas de higiene e de saneamento básico, à vacinação em massa, aos antibióticos, à descoberta do colesterol e dos benefícios da atividade física) provocaram uma extensão dos limites da vida média sem paralelo na história da humanidade.
Nos Estados Unidos, por exemplo, as mulheres que viviam em média 48,9 anos em 1900 passaram a viver 79 anos em 1995. As francesas, que viviam tanto quanto as americanas naquela época, ultrapassaram a média de 80 anos em 1987. Nesse mesmo ano, as japonesas, o subgrupo humano de maior longevidade, atingiram a média de 83 anos. No decorrer do século 20, no Brasil a expectativa de vida também saltou dos 40 anos para a casa dos 70.
À medida que aumenta, a expectativa de vida fica menos sensível à queda dos índices de mortalidade.
Esse aumento espetacular da expectativa de vida fez surgirem as mais variadas especulações a respeito do que acontecerá no século 21. Extrapolando os dados dos últimos cem anos, muitos imaginam que as crianças nascidas nas próximas décadas viverão 150 anos.
Três autores, S. Olshansky, B. Carnes e A. Désesquelles, acabam de publicar um estudo na revista Science que joga um balde de água fria em nossas pretensões de longevidade ilimitada. Os autores compararam os dados demográficos de três países (Estados Unidos, França e Japão) no período de 1985 a 1995 e chegaram às seguintes conclusões:
1) Nos três países, de fato, a expectativa de vida aumentou nesse período;
2) Quando a média de duração da vida de uma população se aproxima de 80 anos, os ganhos futuros em longevidade caminham em passos cada vez mais lentos;
3) Nas próximas décadas, para que a expectativa de vida alcance 85 anos, deverão ocorrer reduções muito drásticas nos índices de mortalidade em todas as faixas etárias. Para atingir esse objetivo entre as mulheres japonesas, o subgrupo que está mais próximo dele, a mortalidade geral deverá cair 20%; no caso das francesas, 26% e, no das americanas, mais do que 50%;
4) Projetando os números obtidos no período de 1985 a 1995, a expectativa de vida dos franceses (homens e mulheres) só chegará aos 85 anos em 2033, a dos japoneses, em 2035 e a dos americanos, em 2182;
5) Para a expectativa de vida ultrapassar 100 anos, mesmo em países com populações de grande longevidade, como França e Japão, será preciso eliminar todos os riscos de morte antes dos 85 anos.
Os números mostram que, à medida que aumenta, a expectativa de vida fica menos sensível à queda dos índices de mortalidade. Esse fenômeno, conhecido como entropia das tabelas demográficas, pode ser ilustrado com as mulheres francesas que, em 1900, tinham expectativa de vida ao redor de 50 anos. Nessa época, bastava uma redução de 4,1% na mortalidade para que a expectativa aumentasse um ano. Nos dias atuais, para aumentá-la de 80 para 81 anos, a mortalidade na França precisa cair 9,1% em todas as faixas etárias.
Nos países industrializados, o impacto da redução da mortalidade ocorrida no século 20 dificilmente será repetido nos próximos cem anos porque foi consequência do controle das doenças infecciosas. No futuro, só haverá aumento significativo da expectativa de vida nesses países se ocorrer redução expressiva dos índices de mortalidade da população acima dos 50 anos, portadora de doenças degenerativas.
Os autores concluem que as análises demográficas do período estudado deixam claro que os próximos aumentos da expectativa de vida serão contados em dias ou meses, não em anos. Para saltos numéricos comparáveis aos do século passado, será necessário acrescentar décadas de vida aos que já viveram mais de 70 anos. Isso só será possível quando a ciência desenvolver métodos eficazes para retardar o envelhecimento do corpo humano.
Aqui vale ressaltar que o conceito de sexo frágil atribuído às mulheres não encontra justificativa biológica. O organismo feminino foi desenhado para durar mais: em todos os países, a vida média dos homens é pelo menos dois ou três anos inferior. Nós, do chamado sexo forte, morremos bem mais cedo do que elas.
A explicação tradicional para essa constatação demográfica tem sido a de que levamos vidas mais atribuladas e cheias de riscos. Afinal, em nossa história evolutiva, nós é que saíamos atrás da caça e declarávamos guerra aos inimigos para roubar-lhes os pertences e o território, enquanto elas permaneciam no aconchego das cavernas tomando conta dos filhos que trazíamos ao mundo. O maior apego feminino à prole também costuma ser usado como justificativa evolucionista. No passado, levaram vantagem na seleção natural não apenas as mães que cuidaram bem de seus filhos, mas especialmente as que viveram mais tempo, entraram em menopausa e puderam ajudar na criação dos netos.
Essas mulheres de vida mais longa teriam deixado mais descendentes, garantindo maior penetração de seus genes no "pool" genético das gerações futuras. Embora avós carinhosas aumentem as chances de sobrevivência dos netos e os dados estatísticos mostrem que os homens têm maior probabilidade de morrer em desastres automobilísticos, em homicídios e em acidentes com armas de fogo, esses eventos não constituem explicação definitiva para a diferença de longevidade entre os dois sexos. A frequência de homicídios e de acidentes fatais começa a aumentar significativamente entre os homens a partir da puberdade, de fato, mas diminui a partir dos 30 ou 40 anos para tornar-se praticamente igual à das mulheres depois dos 60 anos. Mesmo depois dessa idade, entretanto, continuamos a morrer mais cedo do que elas.