Um trauma, mas um trauma racional. Não sei se existe trauma racional, mas se é verdade que o trauma turva percepções, então estou absolvido até na escrita, na condição de traumatizado. O trauma aflora sempre que os vejo se aproximando. Como agora. Os reservas chegaram se espreguiçando à final da Copa das Confederações deste domingo, na Rússia, contra o Chile.
Nesta sexta-feira, na Polônia, a Alemanha venceu a Espanha na final e sagrou-se campeã europeia sub-21. Eu estava no 7 a 1. Lembro de quando saiu o nome do substituto de Neymar, que chegou antes para nós, lá no Mineirão. Espanto. Incredulidade. Todos, nas tribunas de imprensa, acompanhávamos os treinos na Granja Comary desde o primeiro dia de preparação, e a tal alegria das pernas nunca havia dado um sorriso sequer nem na roda de bobinho.
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Nada indicava que Bernard fosse invadir as linhas inimigas. A fase dele – que se mantém até hoje, aliás – era péssima. Os gols foram saindo com a naturalidade da posse de bola do Grêmio. Um, dois, quatro, seis. Sete. O mais humilhante não foi o placar excêntrico, embora a expressão “7 a 1” já mereça condição de verbete no dicionário, tal o número de significações conferidas pelo uso popular.
A vergonha se deu pelo jogo em si. Os alemães não corriam. No máximo aquele trotezinho de final de corrida dominical, para relaxar a musculatura. Um toque curto daqui, outro dali e pronto. A Alemanha trucidou o Brasil caminhando, sem fazer esforço.
Enquanto isso, a Seleção insistia no acessório, como cantar o hino chorando, a lenda da pátria de chuteiras, quem sabe revogar a história e reescrever 1950. Lembro de uma informação que correu pelo estádio com a velocidade das revelações de uma delação premiada até o Jornal Nacional.
Bernard levaria o número 20 às costas para substituir Neymar, assim como Amarildo no lugar de Pelé, em 1962, na Suécia. Neymar e Pelé, claro, usavam a camisa 10. Tudo se encaixava.
– Ah, e outra: o Bernard é mineiro. Mineiro, Mineirão... – alguém ainda lembrou.
Felipão foi para dentro deles porque estava escrito nas estrelas e rubricado pelos deuses da bola. Deu no que deu. A um ano de topar com os alemães na Rússia, a semana nos mostrou que eles melhoraram e pretendem manter a hegemonia por muito tempo.
Mesmo que o banguzinho de Joachin Löw perca a final para o Chile, a surra de 4 a 1 no México já é suficiente para reviver o trauma. Tanto na Rússia quanto na Euro Sub-21, o conceito de futebol se repete. A marcação na saída de bola, a troca de passes curtos em progressão envolvente, os contra-ataques relâmpagos, a reação instantânea de todos para recuperar a posse perdida naquele segundo.
Um time de padeiros alemães jogaria do mesmo jeito. É uma ideia, abraçada pelo país inteiro, dos profissionais aos peladeiros de domingo. No Brasil, a única mudança para melhor foi o técnico.
Seria bom o STF determinar que Tite só saísse de casa para treinos e jogos, e ainda assim com escolta da Polícia Federal. Não podemos correr o risco de assalto, atropelamento ou bala perdida. O Brasil sub-20 nem se classificou para o Mundial da Coreia, vencido pela Inglaterra este ano. O time sub-17 que ganhou o Sul-Americano tem de comprovar a expectativa no Mundial da Índia, em outubro. Há dois anos, no Chile, a categoria caiu nas quartas, para a Nigéria.
A média de público no Brasileirão segue ruim. Os jogos, salvo um ou outro, não empolgam. Começam a surgir os aguardados indícios de picaretagem na construção das arenas de 2014. A CBF continua liderada por Del Nero, que se viajar para o Exterior pode ser preso.
O ex-presidente José Maria Marin continua em prisão domiciliar. Lembro até hoje daquela situação lamentável, o Piangers e eu no ônibus, a caminho de uma final de Copa no Maracanã sem o Brasil, tendo de ouvir os argentinos nos provocando com aquela musiquinha do “tener em su casa su papá”.
Restou-nos torcer para o grande algoz.
Traumático, sem dúvida.
Os alemães vêm aí.