Estávamos nos últimos dias de um duro inverno de Boston quando uma americana me disse que havia um “hint” de primavera no ar. Hint. Era uma palavra nova para mim. Perguntei o que ela queria dizer com aquilo e ela explicou que hint era uma sensação, uma impressão, uma sugestão de algo que estava para acontecer. Gostei. E passei a usar hint para muitas coisas. Não sei se da forma totalmente correta, mas que usei, usei, e fui feliz falando meus hints.
Pois bem. Agora, depois dos resultados parciais das eleições municipais, sinto um hint de mudança na cena política brasileira, uma mudança protagonizada pelos dois maiores personagens populistas do país no momento: Bolsonaro e Lula.
Mesmo sem participar diretamente da eleição, essa dupla teve papel importante no que aconteceu nas urnas. E, de certa maneira, Lula se saiu melhor do que Bolsonaro. Porque Lula também teve um hint antes da eleição de 2018: ele não apostou de verdade em nenhum nome petista, para sucedê-lo. Haddad só foi candidato porque o PT jamais aceitaria não ocupar a cabeça de chapa, na eleição presidencial. O grande investimento de Lula foi em dois nomes de fora do partido: Boulos e Manuela.
Esses dois, Boulos e Manuela, eram vistos nos palanques de Lula antes dele ser preso e depois que foi solto. Lula os elogiava, Lula os festejava, Lula erguia seus braços diante do povo.
Lula os ungiu.
Foi um cálculo certeiro: Lula entendeu que o PT não conseguiria mais preencher o mesmo espaço que preenchera, no campo da esquerda. O partido que fora o maior, mais sólido e mais orgânico da história do Brasil estava, agora, inviabilizado eleitoralmente. Lula, então, aproveitou o espólio do PT. Colocou a estrutura ampla e funcional do partido a trabalhar para políticos de outras legendas. Deu certo. Mesmo que Manuela e Boulos não vençam, eles cresceram e surgem como novos nomes da esquerda brasileira.
Na outra ponta, houve certa dispersão do bolsonarismo, sobretudo com o fracasso de Celso Russomano em São Paulo. Aí me vem outro hint: o de que Bolsonaro, com seu comportamento agressivo, errático e grosseiro, está assustando o seu eleitorado. É um golpe severo para a direita, que, depois dos protestos de 2013, pela primeira vez conseguiu fazer uma articulação realmente popular, no Brasil.
Os exageros de Bolsonaro estão fixando-o num extremo ruidoso, mas limitado, onde estão os ultradireitistas. A massa que o elegeu, ao que tudo indica, está à espera de possibilidades mais amenas.
O Brasil está se afastando dos extremos, portanto. É só um hint, só uma impressão, mas uma forte impressão.