Se você tem uma filha morando nos Estados Unidos e não pode vê-la há mais de um ano, enfrentar uma quarentena de 14 dias no México para obter o direito de visitá-la não parece um pedágio tão caro assim a pagar.
Note-se a sutil diferença entre "não ver" e "não poder ver". Uma coisa é lidar com a distância quando ela é uma opção, uma escolha, uma decorrência de decisões conscientes de pessoas adultas em circunstâncias normais. Filhos viajam, ficam longe, é da vida. E esta mãe já está mais do que acostumada com curtas e longas conversas por Facetime. Não substituem abraços e cafunés, é verdade, mas dão conta de manter a proximidade afetiva em dia em qualquer canto do planeta (com boa conexão à Internet, evidentemente) onde uma ou outra decida se enfiar.
Coisa bem diferente é ser impedida, por um decreto da presidência dos Estados Unidos, de tomar um avião e ir visitá-la a qualquer momento, se me der na veneta, sem antes passar 14 dias fora do Brasil. A pandemia impediu muitas atitudes "de veneta" – e a esta altura de 2021 não preciso explicar a ninguém o efeito psicológico desse arresto sumário da espontaneidade das nossas vidas. (Aliás, essa dificuldade para conter o impulso de fazer coisas "de veneta", mesmo quando esse gesto significa proteger a própria vida e a dos outros, ajuda a explicar, em parte, as equipes médicas esgotadas e as UTIs lotadas de Porto Alegre. Mas essa já é outra conversa.)
Então cá estou eu, em Playa del Carmen, ao sul de Cancún, onde o sol nunca se esconde por muito tempo e o verde do mar rende fotos lindas para o Instagram. E ainda assim, preciso confessar, achando tudo meio chato e sem graça – até os Mojitos.
Em meio a tantas experiências trágicas e dolorosas, as viagens compulsórias e as separações temporárias de familiares talvez mereçam menos do que um pé de página nas futuras descrições dessa realidade distópica chamada pandemia, mas se algum historiador do futuro estiver lendo estas anotações, gostaria de deixar registrado: nem mesmo o Paraíso (neste caso, o Purgatório) parece tão bom assim se você foi parar lá por conta de um decreto da presidência dos Estados Unidos.