Existem duas coisas ainda piores do que uma ideia ruim:
1) uma ideia ruim colocada em prática e
2) uma ideia ruim colocada em prática no pior momento possível.
A ideia ruim é uma obscura corrente de pensamento conhecida como Tradicionalismo (nada a ver com o nosso, o gaúcho). Com a eleição de Trump e Bolsonaro, a ideia ruim saiu dos porões do esoterismo filosófico e alcançou o primeiro escalão do poder nos EUA e no Brasil, através dos ideólogos Steve Bannon e Olavo de Carvalho – ambos defensores e divulgadores de teses centrais do Tradicionalismo. Mas sempre pode piorar. Com a pandemia, a ideia ruim colocada em ação nos dois países legitimou péssimas decisões em termos de políticas públicas, uma vez que entre os princípios fundamentais do Tradicionalismo estão o negacionismo e a guerra permanente contra a ciência e as universidades (sem falar no ódio a tudo que está relacionado à China, inclusive vacinas).
No livro Guerra pela Eternidade, que está saindo agora no Brasil pela Editora Unicamp, Benjamin Teitelbaum, professor de Relações Internacionais na Universidade do Colorado (EUA), investiga a fundo as origens e princípios do Tradicionalismo e sua relação com o novo populismo de direita. Para entender como uma pouco conhecida corrente de pensamento do início do século 20 tornou-se influente no século 21, Teitelbaum entrevistou o russo Aleksandr Dugin, o americano Steve Bannon e o brasileiro Olavo de Carvalho. Os três reconhecem ter sido influenciados por dois dos principais pensadores tradicionalistas: o francês René Guénon (1886-1951) e o italiano Julius Evola (1898-1974).
O Tradicionalismo não é exatamente uma corrente filosófica única e sem contradições internas. Cada um dos entrevistados de Teitelbaum apanhou o que lhe interessava no conjunto de ideias e adaptou aos seus interesses e convicções. O que os três compartilham é o mesmo desprezo pela modernidade em nome de uma “espiritualidade” perdida. Ou seja, o paraíso está no passado e a única transcendência possível é aquela que se encontra na religião.
O problema do Tradicionalismo não é apenas alimentar uma fantasia nostálgica a respeito de um passado que nunca mais vai voltar, questionar o valor da ciência, desprezar conquistas da democracia e aproximar-se perigosamente do racismo e da discriminação de gênero, mas sua incapacidade para apresentar uma proposta clara que não seja a de destruir tudo o que já existe.
Nesse sentido, o empenho na destruição, a versão brasileira do Tradicionalismo, o Tradicionalismo do B, pode se orgulhar de estar caprichando na lição de casa.