Qualquer um pode abrir uma rede social e fazer sucesso de um dia para o outro com alguma extravagância ou dancinha.
Mas antes, nos anos 70 e 80, ter seu nome anunciado de forma pública representava uma conquista a duras penas.
Você suava muito para merecer um cartão de visita, uma placa com seu nome na mesa ou na porta de um negócio. As glórias pessoais dependiam de uma longa travessia pelo anonimato.
Você só se tornava alguém após trabalhar incansavelmente, desde cedo.
Metade da infância acabava sendo engolida por tarefas. Até os doze anos, as crianças ajudavam em casa. Depois, você precisava se virar no mundo. A carteira de trabalho começava de modo precoce, como empacotador de supermercado ou vendedor de lojinha. Tinha que adquirir seu próprio dinheiro e ainda colaborar nas contas da família. Mesadas não educavam ninguém.
Todos corriam para a vida adulta. Para morar sozinhos. Para casar. Para conseguir um emprego fixo.
Hoje nada é mais definitivo. Naquela época, existiam ciclos como comprar seu imóvel, formar família, criar poupança e se aposentar.
A emancipação acontecia na lista telefônica. Correspondia ao batismo da independência, à celebração da autonomia. Você finalmente dispensava orelhões e fichas telefônicas. Estabelecia as conversas com seus afetos a distância, sem sair do lar — um luxo impensável a uma existência presa a fios.
Alcancei essa proeza no meu segundo apartamento, no momento em que obtive a cobiçada linha telefônica. Lutava-se por um telefone fixo (que se transformava em item de herança). O tempo de espera para a instalação da linha era aproximadamente de dois a três anos, e a concessão custava uma bagatela, o equivalente hoje a R$ 5 mil.
Quando apareci na Listel, o livro que reunia os contatos telefônicos da cidade, eu festejei:
— Nejar, Fabrício.
Entre milhares de nomes, eu despontei como o vigésimo Nejar em Porto Alegre.
De costume consagrado, localizavam-se conhecidos e amigos naquela bíblia geográfica, a partir do sobrenome. Havia as páginas na cor cinza, com os paradeiros das pessoas que tinham telefone, e as páginas amarelas, reservadas ao comércio.
Parentes do interior consultavam a lista para surgir de repente, com sua mala e cuia, “oferecendo-se” para permanecer ao seu lado por um certo período, em busca de trabalho ou estudo.
O aparelho tocava, e atendíamos. Acreditávamos na importância do chamado. Diferentemente da atualidade, em que não atendemos mais porque sabemos que é telemarketing. Ninguém mais liga para a residência.
Eu me senti famoso. Deleitei-me por lentas horas naquela linha miúda com a minha nominação.
Falei para meu pai:
— Olhe aí, que orgulho o seu filho!
Larguei o livrão na sua frente.
E ele me pôs no meu devido lugar:
— Quem é famoso tira o nome da lista telefônica para proteger a privacidade.
Privacidade também é algo que não experimentamos mais. Tudo é exposto, escancarado na internet. Não sobra nada para se viver em segredo.