O que eu mais gostava nos álbuns de fotografias da família não eram os retratos em si, mas o papel vegetal que isolava as páginas.
Aquilo trazia uma solenidade, um capricho, um cuidado, mostrando que o material folheado correspondia a uma relíquia.
O caderno ilustrado do casamento dos pais tinha capa dura, nomes dos noivos em relevo dourado e imagens presas em cantoneiras. Tamanha a dedicação imortal da brochura, jamais pareceria que iriam se separar.
Acredito que a mãe tenha permanecido com o álbum durante a partilha. Quem fica com as fotos no divórcio é quem mais amou na relação? Não sei. Talvez.
Só sei que sofri com o fim da união dos pais.
Lembro que não facilitei: discuti com os irmãos, esperneei em almoços e jantares festivos, não quis sair do quarto no Natal, chantageei no carro, fiz greve de fome, renunciei futebol, peguei recuperação, ameacei rodar de ano, chorei no mercado, arrumei brigas com colegas e passei vários recreios na direção, aguardando ser buscado pelo responsável.
Em retrospectiva, tenho pena do pai e da mãe de tanto que os incomodei.
Crianças feridas machucam. Quando somos cacos, machucamos.
Criei um inferno para reconciliá-los, tratei mal as madrastas, afugentei os pretendentes maternos, forcei cenas de reaproximação, menti que um não parava de mencionar o outro.
Nas visitas do pai, perguntava se ele iria dormir ali, sabendo que não, só para vê-lo constrangido e sem saída, balbuciando desculpas educadas.
Eu poderia ter sido mais tolerante e compreensivo, mas o egoísmo é irracional. Você quer manter os pais por perto, ainda que eles não estejam felizes. Não assimila o que é melhor, só quer preservar o que já conhece.
É paradoxal pensar que, não muito tempo atrás, alegávamos ter herdado traumas pelo distanciamento dos pais, gastávamos sessões de terapia para exorcizar a tristeza ancestral, envaidecíamo-nos dos problemas de convivência decorrentes do período, culpávamos os tutores pela ruína da idealização de família, e hoje banalizamos as nossas próprias separações. Não nos penalizamos pela decadência dos laços.
Criticávamos ferozmente os pais, e agora não damos a mínima para os nossos divórcios.
Diante de realidades similares, apresentamos atitudes desproporcionais e incoerentes.
Ideal seria tirar a trave do olho, para depois apontar os ciscos nos olhos dos pais.
É impressionante o quanto nos esforçávamos para manter os dois juntos, e não batalhamos pelo nosso casamento.
Por que não canalizamos as mesmas energias? Por que não usamos semelhante fé para resolver nossas pendengas domésticas?
E se lutássemos para entender nossa esposa como defendemos a nossa mãe?
Se realizássemos metade da birra feita com o pai para conservar os sonhos de casal?
Se trocássemos o orgulho da cobrança pela cumplicidade emocionada do erro?
Se desejássemos falar menos e ouvir mais?
Essa é a diferença entre homens e meninos. Mas, ao contrário do que se convencionou como verdade, se fôssemos meninos para sempre, nenhum amor morreria covardemente.
O papel vegetal protegeria as fotos.