Grandes marcas mundiais interromperam seus contratos publicitários em redes sociais, como o Facebook e o Twitter, por acreditarem que essas gigantes da internet não se esforçam o suficiente para conter os discursos de ódio que são propagados por meio de posts de usuários nestas plataformas. Apesar das queixas e exigência de mudança para mecanismos mais rígidos de controle, parte das pessoas sentem que têm sua liberdade podada nas redes sociais. Na procura por um terreno ainda menos regulado e controlado, foi encontrada a rede social Parler, que vem despontando como a queridinha de conservadores e da extrema-direita.
Criada em 2018, o Parler é um aplicativo de mídia social desenvolvido por John Matze e Jared Thomson. Conforme consta no site da plataforma, a rede social surgiu porque eles estavam “esgotados com a falta de transparência em grandes tecnologias, supressão ideológica e abuso de privacidade”.
Na descrição, consta ainda que o Parler “não é um regulador” e que ali são aceitos o “direito de expressar online seus pensamentos, opiniões e ideias”. É reforçado que as interações no Parler estão sujeitas a diretrizes, mas que, “quando você as respeita, é livre para participar”.
Em um documento de seis páginas, é listado o que é proibido pela plataforma. Ao todo, oito itens constam neste parecer: divulgação de dados pessoais de terceiros, apologia à violência contra animais, apologia ao tráfico de pessoas e à escravidão sexual, apologia ao terrorismo e organizações consideradas terroristas pelo governo dos EUA, calúnia e difamação, chantagem, nudez e pornografia e conteúdos que violam direitos autorais. Em nenhum momento é defendida a proibição de falas que ofendam a dignidade humana ou que violem os direitos humanos.
A moderação de conteúdo, por sua vez, é feita de acordo com a Comissão Federal de Comunicações e na Suprema Corte dos EUA que, com base na Primeira Emenda da Constituição Americana, permite qualquer tipo de expressão, partindo do pressuposto de que essas ideias não se transformem em ações concretas e coloquem em risco um indivíduo ou grupo.
Modo de usar
O funcionamento da rede é muito parecido com o do Twitter. Ali, as pessoas podem publicar mensagens, contudo um pouco mais longas, de até mil caracteres, com imagens e vídeos. É possível também responder outras mensagens, seguir hashtags e repostar publicações de terceiros. Ou seja, a experiência do usuário é a mesma do que a vivida no Twitter, a diferença está na promessa de livre manifestação, observa Maria Clara Bittencourt, pesquisadora e docente do programa de pós-graduação em Comunicação da Unisinos:
— Há esse apelo de que tudo pode ser feito lá dentro, entretanto, existe uma diferença entre liberdade de expressão e atravessar a liberdade e os direitos humanos dos outros. Além disso, mesmo os que entram nessa plataforma atraídos pela suposta liberdade terão de lidar com regras, porque a plataforma tem suas proibições.
A professora destaca que fragmentação entre Parler e Twitter divide ainda mais uma sociedade que já enfrenta sérios problemas de diálogo e debate saudável. Por outro lado, ela afirma que a nova rede ainda não pode ser considerada a plataforma dos extremistas de direita e conservadores devido à baixa adesão de usuários. Para se ter uma ideia, o Twitter tem 166 milhões de usuário ativos monetizáveis, enquanto a estreante tem 1,5 milhão, disse Matze à rede norte-americana CNBC.
Popularidade
Apesar da baixa adesão, o site tem conquistado destaque por atrair políticos conservadores e seus apoiadores. Em junho deste ano, a base do presidente dos EUA, Donald Trump, fez chamamentos no Twitter para que as pessoas migrassem para a nova plataforma. No Brasil, o presidente Jair Bolsonaro e seus filhos políticos, o senador Flávio, o deputado federal Eduardo e o vereador Carlos, criaram seus respectivos perfis.
Flávio chegou a escrever: “Siga-me no Parler! A rede social que tem como prioridade a liberdade de expressão”.
Maria Clara observa que as gigantes da internet não costumavam assumir responsabilidade pelos conteúdos postados por usuários. Mais recentemente, é que essas atitudes foram tomadas, como foi o caso do apagamento de tweets de Bolsonaro, em março deste ano, por violarem as regras do Twitter, segundo informou o site. Apesar da parca regulação, alguns usuários se sentem injustiçados na avaliação da pesquisadora:
— Eles acreditam que o Parler é o espaço para proferir conteúdos que ferem os direitos humanos e que são criminosos, mas o mundo é feito de regras. E a gente tem que se adequar a elas para viver em sociedade.