Douglas Galante
Pesquisador do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais
No dia 20 de julho de 2019, comemoraremos 50 anos do pouso da primeira missão tripulada à Lua, levando os astronautas norte-americanos Neil Armstrong e Buzz Aldrin pela primeira vez a uma superfície extraterrestre, enquanto Michael Collins ficou em órbita dando suporte a seus colegas. Além de ter sido um feito incrível de engenharia e tecnologia, chegar à Lua foi um marco para a ciência, permitindo estudos que vão dos processos de formação do planeta à teoria da relatividade.
A Lua se formou há cerca de 4,5 bilhões de anos, pouco após a Terra ter se consolidado. Um gigantesco impacto com um planetoide do tamanho de Marte arrancou parte do material de nosso planeta, atirando-o ao espaço. Lá ele ficou aprisionando pela gravidade terrestre e se solidificou em nosso satélite natural.
Por ser pequena, cerca de quatro vezes menor do que a Terra, a Lua possui uma gravidade fraca em sua superfície, portanto, não consegue manter uma atmosfera. Sem uma camada de gases ou um campo magnético, sua temperatura varia de forma intensa e ela é constantemente bombardeada por partículas do vento solar. Suas condições ambientais parecem ter sido sempre muito inóspitas. Diante disso, qual o interesse em seu estudo?
Na Terra, as rochas foram alteradas pela erosão das águas e dos ventos, por isso não temos minerais preservados do início do planeta. Ir à Lua e coletar amostras geológicas é como voltar ao passado, porque estas praticamente não foram modificadas por nenhum processo de intemperismo. Isso é especialmente importante quando falamos sobre a origem da vida na Terra. Para o surgimento das primeiras células, foi necessário um aumento de complexidade molecular, que transformou o caldo primitivo de nosso planeta nos blocos básicos da vida: lipídeos, aminoácidos, nucleotídeos. Os minerais tiveram uma importância fundamental para isso acontecer, pois eles podem agir como catalisadores, facilitando as reações químicas.
Assim, as rochas lunares são necessárias para compreendermos os primeiros passos da vida, seja na Terra, seja em outros planetas. Equipamentos de grande porte, como o acelerador síncrotron Sirius, do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), de Campinas (SP), são essenciais para desvendar os detalhes microscópicos e químicos dessas valiosas amostras, além das rochas extraterrestres que serão trazidas pelas futuras missões.
E a Lua guarda ainda mais oportunidades. Estar em sua órbita ou superfície é extremamente desafiador, tanto do ponto de vista tecnológico quanto biológico. Sem um campo magnético como o terrestre, ela está exposta diretamente à radiação espacial. Entender os efeitos desse ambiente sobre a vida é essencial para projetarmos futuras missões espaciais tripuladas de longa duração, em colônias lunares ou voos tripulados para Marte, que podem durar meses ou até mesmo anos. Por essa razão, a Lua pode ser um excelente laboratório para o estudo do ambiente de espaço profundo, permitindo testar diferentes modelos de organismos por longos períodos.
E, para as futuras missões tripuladas, microrganismos serão essenciais, pois eles são capazes de produzir insumos necessários para a produção de estruturas físicas, como os bioplásticos ou biominerais, além de poderem reciclar a atmosfera e a água e produzirem fertilizantes para a hortas espaciais. Além disso, os microrganismos terrestres extremófilos são capazes de sobreviver por longas durações nas condições desafiadoras de missões espaciais. Explorar a diversidade desses microrganismos na Terra e começar a aplicá-los em biotecnologia espacial pode ser um passo fundamental para a conquista humana do cosmos.
Essas oportunidades estão começando a ser exploradas pelo mercado New Space, que está em rápido crescimento e pode representar o futuro da presença humana no espaço. Companhias de todo o mundo estão testando novas modalidades comerciais de exploração espacial, como o turismo e a mineração da Lua e de asteroides. A China já enviou as sondas Chang'e à superfície da Lua para avaliar sua mineralogia, e empresas americanas como a Virgin Galactics e Blue Origin já estão vendendo passagens para voos de turismo suborbitais. A SpaceX está enviando cargas comerciais para a órbita terrestre e planejando voos mais ousados, até mesmo para Marte. No Brasil, já existem algumas iniciativas de exploração do espaço, tanto para fins científicos como comerciais, como a missão Garatéa, que planeja colocar um experimento baseado em cubesats na Lua até 2021.
Apesar de termos pousado na Lua há 50 anos, ela ainda é um excitante desafio para a pesquisa científica e a exploração espacial. Com o desenvolvimento do New Space e a nova corrida espacial, muitas oportunidades nessa área estão se abrindo, as quais o Brasil não deveria perder. Nunca estivermos tão perto de ir para a Lua. E dessa vez, para ficar.