Se é verdade que os robôs serão parte importante das nossas atividades diárias em um futuro bem próximo, como garantir que sirvam tão somente aos (bons) propósitos a que forem designados? Como impedir que sejam dotados de capacidade de aprender e evoluir a ponto de se tornarem independentes — cenário tantas vezes pintado em filmes e livros de teor catastrófico sobre a inteligência artificial?
Para que o pessimismo da ficção científica não vire realidade, cientistas da computação trabalham lado a lado com filósofos, advogados, médicos e representantes de uma série de outras profissões — frequentemente vistas como ameaçadas pela automação — para desenvolver uma espécie de constituição internacional da robótica. Enquanto tantos trabalham na parte mecânica, há um grupo engajado de pesquisadores envolvidos em preocupações mais metafísicas: qual o papel que um robô pode assumir na vida de uma pessoa? Até que ponto ele pode ser levado em ações que impactem a sociedade, ou realizá-las por conta própria? O que pode e o que não pode, o que deve e o que não deve fazer?
Questionamentos como esses pautaram a palestra intitulada "Como podemos criar sistemas de automação e robótica de forma ética", apresentada a uma plateia com representantes de diversos países na Futurecom 2017, realizada em São Paulo nesta semana. Na apresentação, o especialista em robótica Edson Prestes, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), destacou que o tema ainda engatinha em meio ao desenvolvimento científico, mas que têm sido registrados avanços no sentido de ponderar sobre a relação homem e máquina.
— Estamos próximos de viver em um presente em que humanos e robôs vão coexistir. Antes que a hora chegue, é preciso alinhar os valores que esperamos e evitar possíveis impactos negativos — disse Prestes, docente no Instituto de Informática da UFRGS.
Como membro sênior do Instituto de Engenheiros Eletricistas e Eletrônicos (IEEE), o professor se uniu a pesquisadores de todo o mundo a fim de dar os primeiros passos em direção a uma espécie de código de conduta para o desenvolvimento de robôs. Algumas das propostas iniciais incluem a necessidade de que as máquinas a serem criadas promovam apenas o bem-estar das pessoas, que respeitem a privacidade de cada um, que tenham sistemas seguros e confiáveis e que obedeçam, dentro do que for sensato, ao desejo dos humanos.
O caminho não é simples. Prestes exemplifica que mesmo os smartphones, tão difundidos na atualidade, não atendem a uma série dessas ainda incipientes regras: são aparelhos suscetíveis a falhas, passíveis de serem atacados por hackers, dotados de sistemas interessados em nos oferecer produtos. Um robô com essas características não estaria atendendo a uma regulamentação, por ora preliminar, para a relação entre humanos e máquinas.
Preocupações éticas e até afetivas sobre a robótica podem parecer distantes da realidade contemporânea, mas o professor da UFRGS exemplifica que já há soldados que, treinados em combate ao lado de máquinas inteligentes, se sentem próximos dos "amigos" de metal. E que foram dados passos significativos no desenvolvimento de robôs capazes de "ler" emoções humanas e reagir a elas — abrindo espaço para um relação, de alguma forma, sentimental com essas máquinas.
Quanto às preocupações de que um dia os robôs substituirão as tarefas humanas, Prestes se mostra otimista: há funções, sim, que deixarão de ser feitas por pessoas, mas essas se limitam a algumas atividades profissionais que envolvem trabalhos mecânicos. O pensamento, a decisão final em uma situação importante, se forem seguidos os protocolos atualmente em desenvolvimento, serão sempre feitos por humanos.
— Os robôs vieram para ficar e promover o bem-estar das pessoas. Um apocalipse robótico é coisa de cinema.
* O repórter viajou a convite da IEEE.