A ambição brasileira de oferecer internet banda larga para qualquer canto do país foi para o espaço – literalmente. Com um investimento total de R$ 2,7 bilhões, o governo brasileiro lançou, em 4 de maio, de um centro espacial na Guiana Francesa, o Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas (SGDC), primeiro totalmente operado e controlado pela administração federal, em uma parceria entre os ministérios da Defesa e da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações e a estatal Telebras.
Com isso, o governo pretende abrir um canal exclusivo de comunicação para uso militar e, principalmente, contribuir para a implementação do Plano Nacional de Banda Larga, levando internet em alta velocidade a locais do país onde hoje as empresas de telecomunicação não têm interesse ou capacidade técnica para operar. A intenção é disponibilizar antenas para escolas, hospitais e postos de saúde que hoje não contam com esse acesso.
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A capacidade de transmissão e recebimento de dados do satélite poderá também ser explorada pelas operadoras de telefonia, em lotes que passarão por processo de licitação, efetivamente ampliando o alcance de cada uma delas para todo o Brasil – mas sem alguma contrapartida que garanta a oferta de planos mais baratos para áreas remotas, por exemplo. Além disso, a novidade não deve significar o fim das discussões sobre o limite de dados da banda larga fixa no país.
Confira a entrevista feita por telefone com o presidente da Telebras, Antonio Loss.
Qual a finalidade de lançar um satélite como esse?
Temos um país continental, que precisa ser interligado. Esse nosso satélite tem dois propósitos: fazer a banda X, que é a militar e será utilizada para defesa. E fazer a banda Ka, que significa internet de alta velocidade. Nenhum satélite hoje (no país) cobre as regiões remotas, nenhum está disponível em todos os lugares. Agora vamos ter condições de promover de forma igual, em todo o Brasil, internet de alta velocidade, do Chuí a Oiapoque, sem exceção, podendo levar saúde, educação, inclusão social e mais competitividade. É como se estivéssemos colocando uma luz sobre o Brasil.
Como e por quem esses dados serão operados?
Todo o controle desse satélite vai ser feito por brasileiros, em estações que vão estar em Santa Catarina, no Rio de Janeiro, em Brasília, em Mato Grosso e na Bahia. Esses centros vão controlar o satélite, que tem cobertura de todo o território nacional para a banda Ka e toda a América Latina, o Atlântico Norte e o Atlântico Sul (na banda X) para defender a nossa soberania. Hoje, essas fronteiras são feitas por satélites alugados de companhias não brasileiras.
Temos o conhecimento técnico necessário para isso?
Temos a expertise necessária para aproveitar todo o controle desse satélite. São mais de cem engenheiros que estarão envolvidos diretamente no controle. Esse satélite é criptografado, e só nós temos a chave. Então, as informações também estarão muito mais seguras, porque serão tratadas no Brasil, por brasileiros.
A ideia surgiu após o episódio de espionagem internacional sobre a presidência em 2013?
Na verdade, a ideia surgiu porque hoje nós alugamos sistemas de comunicação, tanto para defesa quanto para comunicação. Queríamos um satélite que fosse como um "sol da liberdade em raios fúlgidos", que ficasse em cima do Brasil, levando internet a todos os cantos. É um projeto de Estado mesmo.
Essa tecnologia vai ser utilizada somente pelo governo?
A banda X (que representa 30% da capacidade do SGDC) será destinada 100% para defesa. O restante só serve para dados. O satélite será utilizado para educação, para conectar a saúde, para que possamos ter prontuários, postos de saúde, educação a distância nos lugares mais remotos do Brasil. E ainda vamos fazer aluguel de capacidade, estimulando a concorrência, para que cada região do Brasil tenha, no mínimo, três competidores na mesma área.
As empresas de comunicação poderão, então, utilizar o satélite? Como isso será definido?
Vamos fazer aluguéis da capacidade, mas todo o controle continua sendo de propriedade da Telebras. Três operadores mais a Telebras sempre vão estar presentes em todas as regiões do Brasil. Na verdade, elas (as empresas de telecomunicações) vão locar os lotes. Elas vão estar competindo simultaneamente na mesma área. O processo de licitação está em andamento, estamos colhendo informações da sociedade para enriquecer, utilizando toda a experiência que o mercado de telecomunicações do Brasil já tem.
A ideia é abater uma parte dos R$ 2,7 bilhões gastos com o projeto?
O principal agora é ter garantia da nossa defesa e estimular, promover que esse satélite possa levar comunicação via satélite para regiões que jamais teriam, como escolas rurais, hospitais, centros de saúde (remotos). Esse é o principal objetivo. Mas mesmo assim vamos ter capacidade para fazer comercialização.
O lançamento do satélite pode evitar que a banda larga fixa volte a ter limite de dados?
Imagina que nós temos mais uma camada agora. Temos uma rede metálica, uma rede de fibra, e agora a competência de uma camada de satélite. Todos esses sistemas se integram e fazem um sistema de telecomunicações muito mais robusto, porque posso combinar as transmissões.
Mas não é garantia de que não haverá mais limite de dados na banda larga então?
É mais um dispositivo que ajuda a ter a integração. Que nos dá liberdade.