Uma trama envolvendo um grupo especializado em estelionatos está por trás do desaparecimento e assassinato do médico Gabriel Paschoal Rossi, 29 anos, segundo a Polícia Civil do Mato Grosso do Sul. O gaúcho, que vivia e trabalhava em Dourados, foi encontrado morto na semana passada, após sumir. Quatro pessoas — três homens e uma mulher — foram presos em Minas Gerais. Os detalhes foram divulgados na manhã desta terça-feira (8).
À frente da investigação, o delegado Erasmo Cubas, chefe do Setor de Investigações Gerais (SIG), detalhou em coletiva à imprensa como a apuração chegou aos suspeitos do crime. Foram presos em Minas Gerais Bruna Nathalia de Paiva, 29 anos, Gustavo Kenedi Teixeira, 27, Keven Rangel Barbosa, 22, e Guilherme Augusto Santana, 34. Os detidos, que foram levados para Dourados, ainda serão ouvidos pela polícia.
Conforme o delegado, a mulher teria tramado a morte do médico, em razão de uma dívida que teria com ele. Cubas afirmou que Rossi conhecia Bruna havia alguns anos, desde o período em que era universitário em Dourados, e teria sido envolvido por ela num esquema de fraudes com cartões bancários e saques de benefícios usando documentos adulterados. A quadrilha teria atuação em Minas Gerais — a polícia não soube informar como Rossi conheceu Bruna.
— Ela é a mentora e determinou o homicídio. Ela não vai na cena do crime, ela só coordena — afirmou o delegado.
De acordo com a investigação, Rossi teria valores a receber de Bruna, que seriam resultado das fraudes — não foi detalhado como teria se originado essa dívida. A polícia estima que essa soma possa chegar a R$ 500 mil.
Após ter sido confrontada por ele a realizar o pagamento, conforme a polícia, a mulher teria decidido matar o médico. Para concretizar o assassinato, teria contratado os executores. Há suspeita de que Bruna pagou cerca de R$ 50 mil a cada um deles.
Na manhã de 27 de julho, Rossi teria ido até a casa na Vila Hilda, em Dourados, para encontrar uma pessoa que teria sido indicada por Bruna. O crime, segundo a investigação, já havia sido planejado. O grupo havia chegado ao Mato Grosso do Sul um dia antes e aguardava pelo médico. Na casa, Rossi teria sido torturado pelos criminosos das 7h até por volta de 20h, quando eles deixaram o local. Foi usada uma sacola plástica para asfixiar a vítima, que tinha também perfuração no pescoço.
A perícia indicou que a morte de Rossi só teria acontecido cerca de 48 horas depois. Isso fez a polícia concluir que o médico não estava morto quando foi deixado no local, mas não conseguiu pedir socorro porque estava amarrado e ferido. A casa havia sido alugada pela quadrilha por 15 dias, em razão disso, ninguém foi até o imóvel nesse período. Para o delegado, a locação por tempo mais longo já fazia parte do plano arquitetado para o crime.
— Eles locaram com a intenção de matar o Gabriel lá. A casa ficaria trancada por 15 dias, e não iam achar o corpo — afirmou Cubas.
Como a polícia identificou grupo
Ao longo da investigação, a polícia descobriu que o celular de Rossi emitia sinais em Minas Gerais. Naquele momento, uma das suspeitas era de que o médico pudesse ter sido sequestrado. Após o sumiço, mensagens chegaram a ser trocadas com familiares e amigos dele. A linguagem fez as pessoas suspeitarem de que se tratava de outra pessoa. Conforme o delegado, quem enviava essas mensagens era Bruna, tentando se passar pela vítima.
Durante os depoimentos de amigos e pessoas próximas ao médico, a polícia chegou ao nome de Bruna, que residia em Minas Gerais e manteria contato com Rossi há algum tempo. Com a localização do corpo, os investigadores descobriram que uma outra casa havia sido alugada em Dourados para o período de 26 e 27 de agosto.
Nesse imóvel, que fica a cerca de cinco quilômetros de onde estava o corpo de Rossi, a polícia conseguiu obter imagens de câmeras de segurança. A partir daí, os suspeitos de envolvimento foram identificados.
A polícia descobriu, com auxílio da Polícia Rodoviária Federal (PRF), que eles viajaram de Minas Gerais até Campo Grande de ônibus, depois seguiram de carro até Ponta Porã e de lá foram, também num veículo, até Dourados. Na volta, o grupo teria regressado de avião de Campo Grande para Minas Gerais. Com auxílio da polícia mineira, foram localizados os endereços dos suspeitos, que acabaram presos na segunda-feira (7).
Com eles, foram apreendidos celulares, cartões bancários, roupas que teriam sido as mesmas usadas na data do crime, e uma arma de choque. A polícia acredita que o equipamento tenha sido utilizado para intimidar e render o médico. Uma caixa, com nome de Bruna, que seria dessa arma, já tinha sido apreendida no local do crime. O celular de Rossi não foi localizado até o momento.
Segundo o delegado, durante a investigação, outras hipóteses chegaram a ser levantadas, como um possível crime passional, mas essas possibilidades foram descartadas no curso da apuração. Cubas afirma que essas informações teriam sido disseminadas pela própria investigada, como forma de tentar confundir a elucidação do crime.
Após a morte do médico, além de tentar obter dinheiro de pessoas próximas à vítima, o grupo ainda teria conseguido acessar pelo menos uma das contas bancárias e retirar o dinheiro.
— A Bruna tinha expertise em golpes, estelionatos. Ela era amiga pessoal dele e criou diversos contextos, pedindo dinheiro. Nisso conseguiu esvaziar uma das contas dele e pedir dinheiro — explica o delegado.
Apesar disso, segundo Cubas, o crime segue sendo tratado como homicídio, já que a intenção desde o início seria assassinar o médico.
O esquema
Segundo a Polícia Civil do Mato Grosso do Sul, todas as informações reunidas sobre os supostos golpes serão repassadas às equipes de Minas Gerais, para que possam seguir a apuração. Em relação à participação do médico, Cubas afirmou que Rossi seria responsável por realizar saques de benefícios, com documentos forjados encaminhados pela quadrilha. A participação dele teria iniciado no período em que era universitário.
— Tudo dava certo, até ele participar de algum evento que gerou montante mais alto, que Bruna não queria repassar pra ele — afirmou o delegado na coletiva.
O sumiço
O médico desapareceu em 26 de julho, data em que deixou o trabalho após concluir o plantão, em Dourados. O sumiço foi percebido durante o fim de semana, quando o gaúcho deixou de conversar com pessoas próximas. As buscas tiveram início na quarta-feira (2), quando foi realizado registro do desaparecimento.
O médico residia num apartamento em Dourados, mas o corpo dele foi localizado no dia seguinte, numa casa alugada. Uma vizinha da residência ligou para a polícia relatando odor desagradável e a presença de um carro — o de Rossi — parado no local há uma semana. O veículo, um HB20, estava estacionado em frente à casa.
Quando os policiais chegaram ao local, encontraram o corpo de Rossi dentro do quarto, sobre a cama. O cadáver já estava em decomposição, indicando que a morte teria ocorrido dias antes. O corpo foi encontrado com pés e mãos amarrados, com sinais de asfixia.
O médico
Natural de Santa Cruz do Sul, no Vale do Rio Pardo, Rossi era formado em Medicina pela Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD). Ele trabalhava na Unidade de Pronto Atendimento (UPA), na Caixa de Assistência dos Servidores do Estado de Mato Grosso do Sul (Cassems) e no Hospital da Vida. Após a confirmação da morte do médico, o Hospital da Vida publicou uma nota de pesar manifestando solidariedade aos familiares e amigos de Gabriel.